Editorial
19/05/2022Febre da inflação atinge Brasil e EUA, mas aqui dará mais dor de cabeça
Para o economista teremos desaquecimento, juros mais elevados e redução do crescimento
Inflação no Brasil está a 12%, com juros de 13%, desemprego de 12% e PIB com crescimento entre 0,5% e 1%
(Arte: TUTU)
Por Fábio Pina*
O mundo passa por um momento de pressões inflacionárias bastante generalizadas. Alguns países, mais; outros, menos, mas nenhum escapou ileso de dois anos de pandemia. Basta lembrar a quebra da cadeia produtiva em setores como a produção de automóveis ou a alta dos fretes marítimos, que subiram de US$ 1,5 mil por tonelada transportada para mais de US$ 12 mil no período.
A maioria das pessoas no mercado de trabalho atual não se lembra das décadas de 1970 e de 1980, quando o mundo desenvolvido enfrentou taxas de inflação elevadas. Muitos se recordam da década de 1990, quando as nações emergentes lutavam contra o problema – então resolvido nas economias desenvolvidas.
Grande parte das pessoas adultas hoje só tem a referência de um período deflacionário a partir dos anos 2000, com a integração mais efetiva das cadeias produtivas e a entrada do Sudeste Asiático como grande protagonista no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) global.
Esse movimento produziu o fenômeno de achatamento de preços ou de inflação muito baixa ao redor globo por pelo menos duas décadas.
Veja também:
Apesar da inflação elevada, varejo e serviços surpreendem positivamente no primeiro trimestre
Reforma Trabalhista: seminário realizado pela FecomercioSP e pelo Sincomercio em Botucatu debate segurança e judicialização de questões de trabalho
Em março, turismo nacional cresce 43,5% na comparação anual
A mudança de cenário agora não é uma garantia de que o mundo esteja definitivamente de volta ao período inflacionário, mas há ao menos um processo febril nos preços, e que deve ser combatido antes que seja tarde demais.
É aí que entra a política monetária. Mas não só ela. Se o presidente do Banco Central (BC) quiser conter a inflação, enquanto o secretário do Tesouro resolver injetar dinheiro na economia, o trabalho de controle de preços se tornará muito pouco eficiente.
Nos casos de Brasil e Estados Unidos, ambos os países têm evidentes pressões de preços atingindo a população, desde o produtor até o consumidor final, mas as condições macroeconômicas de cada um são diferentes.
É verdade que a velocidade de atuação das suas autoridades monetárias também não é a mesma. Vale uma menção honrosa para o BC, que, ainda que tenha se atrasado um pouco para reagir, sem dúvida foi um dos mais rápidos do mundo a começar o combate inflacionário.
Infelizmente, por inúmeros problemas sobre os quais não cabe mencionar em breves linhas, o combate à alta de preços no Brasil é sempre muito mais custoso do que na nação da América do Norte.
Aqui, mesmo sob um mercado de trabalho pouco aquecido e com taxas de juros muito elevadas, a alta de preços tende a ser mais resistente.
Há maturidades econômica e de moeda distintas em cada país, que, neste caso, favorecem os Estados Unidos.
Todavia, não é verdade que a política fiscal nacional seja a única que esteja se comportando de forma expansionista, pois a americana também está. Na verdade, o ritmo de expansão fiscal dos EUA tem sido muito maior do que o brasileiro.
Ainda assim, a inflação no Brasil está a 12%, com juros de 13%, desemprego de 12% e PIB com crescimento entre 0,5% e 1%.
A economia fraca não tem sido motivo suficiente para conter os preços, e é possível que o BC tenha de elevar mais os juros e reforçar o freio do ritmo da atividade no Brasil.
Nos Estados Unidos, a inflação está a 8% (muito alta para o histórico das últimas quatro décadas); os juros, entre 0,25% e 0,5%; o desemprego, abaixo de 5%; e o PIB com avanço superior a 3%.
Ou seja, o combate à inflação no Brasil vai causar mais sofrimento do que nos Estados Unidos.
Pode ser que aqui cheguemos a ver indícios de estagflação, mas não há elementos para dizer que um aperto monetário ao Norte do continente gere recessão.
Parece exagerada a hipótese de os juros, ao atingirem 3% neste ano nos Estados Unidos, causarem recessão.
Em resumo, teremos desaquecimento, juros mais elevados e redução do crescimento lá e cá – porém mais cá do que lá.
Talvez tenhamos um processo recessivo aqui – não há certeza disso –, com a manutenção do desemprego elevado. Por sua vez, pode haver uma desaceleração menos contundente ao Norte, que deve ficar perto do pleno emprego mesmo com a elevação dos juros.
Bom, isso tudo caso vivamos tempos mais constantes, o que não tem sido o cenário dos últimos anos.
*Fábio Pina é assessor econômico da FecomercioSP.
Artigo originalmente publicado no Portal TradeMap em 16 de maio de 2022.