Economia
04/12/2025Juros pressionam empresas, travam investimentos e prolongam a estagnação econômica
Impacto das taxas elevadas foi tema das reuniões dos conselhos de Serviços e do Comércio Atacadista da FecomercioSP; estudo aponta que famílias e empresas pagaram R$ 1,148 trilhão em juros em 2024
O peso dos juros elevados sobre os resultados das empresas e sobre o comportamento da economia brasileira foi o principal tema das reuniões dos conselhos de Serviços e do Comércio Atacadista da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP),realizadas nos dias 17 e 18 de novembro. Empresários de ambos os setores demonstraram preocupação quanto à desaceleração recente dos negócios e com a tendência de que esse quadro se estenda até o ano que vem.
Em sua apresentação, Fabio Pina, assessor econômico da FecomercioSP, divulgou dados e análises que reforçam a dimensão do problema, além de avaliar como o ambiente macroeconômico, a produtividade e o tamanho do Estado determinam o custo do crédito e moldam os desafios das empresas nos próximos anos.
Pressão crescente sobre consumo e investimentos
Um estudo inédito da FecomercioSP detalha o impacto dos juros para o orçamento das famílias e o caixa das empresas brasileiras. Em 2024, foram pagos R$ 1,148 trilhão só em juros — um salto de 17% em relação a 2023.
Desse total, R$ 859,9 bilhões saíram das famílias e R$ 287,9 bilhões, das empresas.
O contraste entre o custo financeiro e capacidade de renda é marcante. A massa de rendimentos dos lares cresceu apenas 3,2%, enquanto as despesas com juros avançaram 20,5% no mesmo período. Isso significa que 10,63% da renda familiar foi destinada ao pagamento de juros, índice que era de 9,11% no ano anterior. Esses dados indicam que o mercado de crédito segue sendo a sustentação da demanda agregada, com crescimento de concessões e queda na taxa de inadimplência.
A retração do volume de inadimplentes, em conjuntura de juros altos, é positiva e provavelmente motivada pelo mercado de trabalho aquecido. Entretanto, há um aumento no comprometimento da renda dos lares e do caixa de negócios com dívidas. Além disso, a renda brasileira fica cada vez mais concentrada no setor financeiro — o que é mais perverso, considerando que os rendimentos reais não crescem nessa mesma dimensão, criando um horizonte arriscado para a sustentabilidade do consumo e dos investimentos.
Custo financeiro: entrave para as empresas
Da mesma forma que as famílias, o volume de juros pagos pelas empresas do País também cresceu de forma vertiginosa em 2024: 7,8% em relação a 2023, atingindo R$ 287,9 bilhões. Essa expansão ocorreu sobre uma forte base de comparação, já que o montante de juros pagos havia avançado 21,9% no ano anterior em comparação com 2022 [tabela 1]. O saldo de inadimplência caiu 16,3%, ao passar de R$ 49,2 bilhões, em 2023, para R$ 41,2 bilhões, em 2024 — e, com isso, a taxa de inadimplência recuou de 3,13% para 2,51% no mesmo período.
São informações como essas que reforçam análises recentes de como o custo financeiro ainda é um dos principais impasses para a retomada de investimentos privados, assim como a elevada carga tributária nacional. O peso dos juros é ainda maior para as Pequenas e Médias Empresas (PMEs).
[TABELA 1]
PAGAMENTOS DE JUROS — EMPRESAS (2024)
Fontes: Banco Central/IBGE/FecomercioSP
Período | Juros pagos¹ | Var. (%)/ Juros pagos | Inadimplência (em bilhões)² |
Var.% |
2022 | R$ 219,1 | – | R$ 32,8 | |
2023 | R$ 267,1 | 21,9% | R$ 49,2 | 49,8% |
2024 | R$ 287,9* | 7,8% | R$ 41,2 | -16,3% |
Serviços — desaceleração crescente e investimentos travados
Nos Serviços, Pina ressaltou que vários indicadores mostram perda de tração no segundo semestre de 2024. Mesmo com vendas positivas, as margens estão comprimidas, e o custo do capital de giro pesa cada vez mais no fluxo de caixa.
O estudo reforça essa leitura. A taxa de juros média mensal para empresas permaneceu alta (1,61%), e o saldo de crédito avançou apenas 4,4% em 2024, longe do necessário para destravar novos projetos.
Atacado — crédito caro e consumo pressionado
No Comércio Atacadista, a percepção é semelhante. O custo financeiro afeta toda a cadeia, pressionando capital de giro, ampliando prazos de recebimento e reduzindo a capacidade de repor estoques.
A queda da inadimplência entre empresas — reflexo de renegociações e mais seletividade bancária — não significa melhoria do ambiente de negócios. Ao contrário. Segundo o estudo, o Brasil convive com juros reais entre 7% e 8%, patamar que inibe investimentos, comprime margens e dificulta a expansão do Varejo e do Atacado.
Perspectivas para 2026
Para Pina, 2025 deve encerrar com o mesmo ritmo de 2024: juros ainda elevados, inflação relativamente alta (mas controlada) e risco fiscal crescente. A expectativa de melhoria mais concreta recai sobre 2026, quando um novo governo terá de apresentar propostas críveis de reorganização das contas públicas — condição necessária para que o País consiga reduzir juros de maneira sustentável e retomar o crescimento. “Estamos dançando na beira do precipício, mas ainda não caímos”, resumiu o economista, alertando que, sem reformas sólidas, a conta pode chegar em 2027.
O que os empresários podem fazer?
Diante de juros persistentemente altos e da desaceleração econômica projetada, especialistas da FecomercioSP recomendam algumas estratégias. Veja a seguir.
- Reavaliar fluxos de caixa e ciclos operacionais — antecipar pagamentos, renegociar prazos com fornecedores e revisar estoques podem reduzir a necessidade de capital de giro.
- Buscar linhas de crédito mais baratas e garantias alternativas — programas como Pronampe, Fundos Garantidores e operações estruturadas podem aliviar o custo médio da dívida.
- Investir em eficiência operacional — automação, digitalização e revisão de processos ajudam a compensar a queda das margens.
- Evitar endividamento de curto prazo — com taxas ainda elevadas, priorizar financiamentos longos e flexíveis é essencial.
- Acompanhar a agenda fiscal — as decisões de 2026 serão determinantes para juros, inflação e crescimento. Planejamentos estratégicos devem considerar cenários distintos para o próximo ciclo presidencial.
Mesmo sob forte pressão financeira, o setor de Serviços e o Comércio Atacadista mantêm protagonismo na economia brasileira. Mas a FecomercioSP adverte que, sem mudanças estruturais, o País continuará desperdiçando potencial de crescimento, e famílias e empresas seguirão arcando com um custo financeiro que compromete consumo, investimentos e geração de emprego.