Economia
24/10/2024“Reforma política precisa voltar ao debate no País”, defende Luiz Felipe d'Avila
Cientista político e presidenciável em 2022 fala sobre o Brasil em encontro do Fórum Empresarial de Modernização do Estado
O cientista político Luiz Felipe d'Avila diagnostica: atualmente, do jeito que está, a estrutura institucional brasileira estimula a sobrerrepresentação parlamentar de determinados grupos, afasta os representantes da população e, ainda, permite o “inchaço” de partidos políticos no Congresso. Tudo isso financiado por uma máquina pública que, no limite, contamina o processo eleitoral, “e não é à toa que os presidentes das siglas sejam os responsáveis por eleger candidatos hoje, e não o povo”, sentenciou ele.
Candidato à Presidência da República, em 2022, pelo Partido Novo, D’Avila foi o convidado para a reunião de outubro do Fórum Empresarial de Modernização do Estado (FEME), do Conselho Superior de Economia, Sociologia e Política da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP). É essa análise que faz com que o cientista político sustente o posicionamento de que uma reforma política precisa voltar a ser debatida no País. A última vez que isso aconteceu foi em 2021, quando o parlamento mudou regras acerca das candidaturas de mulheres e pessoas negras e sobre fidelidade partidária, entre outros pontos. “Essa também é, ao lado da Reforma Administrativa, uma das modernizações mais importantes a serem realizadas. Nós convivemos com distorções gravíssimas — para não dizer contraditórias — dentro do sistema”, observou, elencando alguns aspectos que, a seu ver, são mais relevantes.
O primeiro é a distribuição de cadeiras no Legislativo, que, hoje, funciona com um piso de 8 deputados por Estado e um teto de 77. Segundo o cientista político, o sistema sobrerrepresenta algumas unidades da Federação, enquanto diminui o valor do voto em outras. Ele faz, por exemplo, uma comparação entre o Amapá, em que cada cadeira na Câmara dos Deputados representa cerca de 90 mil habitantes, ao passo que em São Paulo, esse número é superior a 600 mil pessoas. “Em outras palavras, o voto de um amapaense vale muito mais do que o voto de um paulista.” O cientista político ressaltou que a solução passa por uma revisão dessa distribuição, que deve considerar a representação populacional de cada unidade federativa, e não os números preestabelecidos pela lei. “Nessa conta, São Paulo precisaria ter 120 cadeiras no parlamento, pelo menos”, explicou.
Há ainda a necessidade de manter a cláusula de barreira, que funciona para impedir que muitos partidos fragmentem as discussões no Congresso. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Brasil entrou na eleição municipal deste ano com 29 siglas registradas, das quais pelo menos dez contam com lideranças próprias na Câmara dos Deputados. Desde 2017, a cláusula define que somente podem ter acesso aos recursos do Fundo Partidário — que financia as campanhas eleitorais — e à propaganda gratuita em rádio e televisão os partidos que alcançassem pelo menos um dos critérios de desempenho fixados nas regras. Esses elementos passam pela eleição de pelo menos 11 deputados federais, distribuídos em pelo menos nove unidades da Federação; ou a obtenção de, no mínimo, 2% dos votos válidos nas eleições para a Câmara dos Deputados, distribuídos em aos menos nove unidades da Federação, com um mínimo de 1% dos votos válidos em cada um deles. “Isso deve continuar. Temos de reduzir ainda mais o volume de partidos para termos uma coesão maior dos debates relevantes no parlamento”, afirmou d’Avila.
O terceiro ponto é a implementação do voto distrital, que foi amplamente debatida há alguns anos, mas voltou a ficar em segundo plano. Nessa lógica, seriam delimitados distritos, e os partidos teriam de indicar um candidato para concorrer em cada uma dessas localidades. Esse sistema permite uma conexão maior entre representante e representado pela proximidade geográfica com o eleitor. O deputado, então, será o representante daquele bairro ou região. Para d'Avila, no modelo atual, os parlamentares não têm base representativa. “No limite, eles nem sabem quem são os próprios eleitores, o seu público. Atuam em Brasília como se falassem para várias pessoas diferentes. É uma distorção não apenas institucional, mas política.”
Por último, ele ainda defendeu a mudança na regra de financiamento de campanhas eleitorais, que, com a proibição de doações de pessoas jurídicas estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2015, tornou o Fundo Eleitoral a principal fontes de receita para esse fim. Neste ano, foram distribuídos R$ 4,9 bilhões para as eleições municipais, segundo o TSE. O argumento de d'Avila é que todo esse dinheiro é direcionado pelos presidentes das siglas para as candidaturas mais relevantes, seja por causa dos nomes colocados na lista, seja em razão de interesses políticos. Nós estamos delegando a essas figuras a eleição dos representantes. Não é o povo que escolhe. São eles”, lamentou. “Eu diria que esse dispositivo precisa ser urgentemente revisto, porque é um absurdo manter o fundo do jeito que está.”
Durante a conversa, o presidente do Conselho Superior de Economia, Sociologia e Política da FecomercioSP, Antonio Lanzana, reforçou que o diagnóstico de d'Avila é, além de preciso, um mapa para uma agenda que deve ter mais força nos debates institucionais daqui para a frente. Além disso, ele deixou a estrutura da FecomercioSP à disposição para que isso aconteça . “Nós estamos preparados para levar essas propostas às autoridades e ampliar esse debate”, afirmou.
Gargalos econômicos
Na abertura do encontro, Lanzana também lembrou que o pleito da Reforma Administrativa que a FecomercioSP está encabeçando, com dezenas de outras entidades do setor produtivo e da sociedade civil organizada, vem obtendo resultados relevantes nas discussões com as autoridades.
A Federação entregou, recentemente, ao deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL/SP), algumas propostas para serem adicionadas ao escopo do seu Projeto de Lei Complementar (PLP) 51/2019, que sugere mudanças no modelo de avaliação do desempenho de servidores públicos do País. Durante visita do parlamentar à sede da Entidade, em São Paulo, na semana passada, ele também colocou a Frente Parlamentar do Livre Mercado à disposição para o debate.“É uma modernização essencial”, avaliou o cientista político. “A promoção da carreira deve ser baseada no mérito. Precisamos ter gente entregando serviço de qualidade à população. Essa proposta permitiria melhorar isso significativamente”, finalizou.
Ainda durante a reunião, d ‘Avila aproveitou o tema para apresentar outro diagnóstico sobre o Brasil, cujo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foi, nos últimos dez anos, de uma média de pouco mais de 1%. Ele ainda destacou que isso se deve a três fatores: falta de investimentos em Educação, prejudicando a produtividade e mantendo o Brasil profundamente desigual; economia ainda muito fechada ao comércio internacional (o País é o 26º maior exportador do mundo, segundo a Organização Mundial do Comércio — OMC); e, por fim, instabilidade política. “Não é à toa que os premiados pelo Nobel de Economia deste ano foram pesquisadores de instituições. Os argumentos deles atravessam a lógica de que países estáveis tendem a crescer mais ao longo do tempo”, disse, citando as premiações dadas aos economistas James Robinson, da Universidade de Chicago, e Daron Acemoglu e Simon Johnson, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos.
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