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Editorial

Trabalho: por que ter medo das novas tecnologias?

Elas abriram as portas para o trabalho a distância e para a realização de várias tarefas ao mesmo tempo, mas trouxeram o medo do desemprego

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Trabalho: por que ter medo das novas tecnologias?

Participei do Seminário sobre “O Futuro do trabalho: por que ter medo das novas tecnologias?”, organizado pelo Conselho de Emprego e Relações do Trabalho (Cert) da Federação do Comercio em São Paulo. Com base nas exposições apresentadas pelos especialistas, aprendi que as novas tecnologias fazem parte de processo irreversível em nossas vidas e no nosso trabalho. O telefone celular, por exemplo, tornou-se extensão do corpo e da mente humana que permite o acesso a gigantescos bancos de informações para a tomada de decisões. As novas tecnologias têm provocado rupturas nos sistemas de trabalho, como é o caso do Uber no transporte, Pay Pal nos bancos, Netflix na mídia, iTunes na música e WebMed na saúde.

Chegamos à era da internet das coisas. Para a dona de casa dos Estados Unidos, que usa uma máquina de lavar roupa, basta apertar um botão na própria máquina para que a Amazon.com receba pedido de sabão em pó que será entregue no domicílio em algumas horas. O mesmo é feito pelo supermercado, que recebe pedidos pelo celular e entrega as mercadorias no mesmo dia. Os seres humanos têm hoje enorme quantidade de informações para orientar as ações. As novas tecnologias abriram as portas para o trabalho a distância e para a possibilidade de o trabalhador realizar várias tarefas ao mesmo tempo. O que apavora as pessoas é verificar que, onde entra a máquina, sai o trabalhador. O medo do desemprego cresce na mesma velocidade com que entram em ação as inovações da ciência.

Na literatura, há muita divergência sobre o assunto. Há autores que consideram inexorável a destruição de empregos de pessoas que não terão o que fazer em decorrência da modernização tecnológica (Martin Ford, Rise ofthe robots— technology and threatofa jobless future, New York: Basic Books, 2015). Outros acham que as novas tecnologias mais criam do que destroem empregos, além de garantirem ambientes de trabalho mais confortáveis, evitando acidentes e melhorando a segurança dos trabalhadores. Para eles, os ganhos são maiores do que as perdas (Deloitte, Technology and people: thegreatjob creating machine, London, 2015).

É consensual, porém, a ideia de que as novas tecnologias criam demandas por trabalhadores com qualificações muitas vezes inexistentes no mercado de trabalho. Para usar bem as inovações, os trabalhadores precisar ter bom senso, lógica de raciocínio, capacidade de trabalhar em grupo, versatilidade para transportar conhecimentos de um lado para outro. Ou seja, será preciso saber pensar e pensar bem, o que coloca um desafio gigantesco às escolas da maioria dos países. No Brasil, precisaremos de novo pacto educacional e líderes competentes para fazer avançar os métodos de ensino sem complicações de leis e regras que engessam a criatividade humana.

Além disso, as novas tecnologias criam formas de trabalhar bem diferentes da situação do trabalho fixo e com prazo indeterminado que é característico do vínculo empregatício. O trabalho realizado a distância e em parceria com outros trabalhadores e em jornadas irregulares dificilmente se enquadra nas leis do trabalho atuais, como é o caso da CLT. Daqui para a frente, cada vez mais as pessoas serão contratadas e remuneradas com base naquilo que produzem e não em razão do tempo que dedicam ao trabalho. Isso exigirá extensas mudanças nas leis rígidas que foram criadas num tempo em que nem o computador existia e muito menos os bancos de big data, os robôs e a inteligência artificial.

Em suma, os desafios são enormes tanto para a educação quanto para a CLT. De tudo o que foi apresentado, fiquei com a impressão de que as mudanças necessárias na área das relações do trabalho são as mais urgentes. Isso porque o Brasil tem uma economia complexa, heterogênea e diversificada. Os empregos não vão desaparecer ou ser transformados de imediato. As mudanças serão graduais e seletivas, o que permitirá às escolas irem se adaptando às novas demandas. Mas o volume de atividades atípicas, que não se enquadram no figurino do vínculo empregatício da CLT, já é enorme, e cresce a velocidade sem precedentes. O nosso sistema de contratação e remuneração do trabalho precisa ser repensado com a maior urgência, pois os que trabalham de forma atípica precisam de proteção tanto quanto os que trabalham de forma convencional. Para o legislador, portanto, é imperioso desenvolver paradigmas que garantam a proteção dos trabalhadores nas novas situações de trabalho criadas pelas novas tecnologias.

José Pastore é presidente do Conselho das Relações do Trabalho da FecomercioSP.
Artigo publicado no jornal Correio Braziliense em 12/11/2015, página 15.

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