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Editorial

Especialistas debatem os caminhos para uma reforma política eficaz no curto e longo prazo, na sede da FecomercioSP

Membros da academia e de movimentos sociais levantaram questões importantes para construir uma reforma sólida e que rompa com os vícios atuais

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São Paulo, 28 de abril de 2017 - A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), o Grupo Estado e a plataforma multimídia UM BRASIL realizaram nesta quinta-feira (27/04) o "Fórum Estadão - A Reforma Política que queremos". O objetivo do evento foi discutir os pontos cruciais para uma reforma política brasileira de fato, que altere o sistema político viciado pelos conchavos e formação de partidos sem identidade, que dificultam a renovação política e a representatividade da sociedade. 

Dividido em dois painéis, moderados pela jornalista Eliane Cantanhêde, o Fórum trouxe figuras de peso da academia como o doutor em Ciências Políticas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Jairo Nicolau, o professor de ciência política na Universidade de São Paulo (USP), José Álvaro Moisés e o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), José Eduardo Faria. E também representantes de movimentos sociais e políticos, como o fundador do Movimento Vem Pra Rua (MVPR), Rogerio Chequer, o diretor-presidente do Centro de Liderança Pública (CLP), Luiz Felipe d'Avila e do membro do Insper, Milton Seligman. 

Durante a abertura do evento, o sociólogo e copresidente do Conselho de Economia, Sociologia e Política da FecomercioSP, Paulo Delgado, salientou que a realidade política brasileira está ultrapassada e isso gera falta de representatividade na população. "A política brasileira vive um mundo abolido em países desenvolvidos, pois o País está viciado no comportamento populista, de direita ou esquerda, onde muitos se perguntam se nas eleições democráticas é possível fazer governos bons? Mas a culpa pela frustração política não pode ser atribuída apenas ao eleitor, pois quem os escolhe de fato são os partidos políticos, os cartórios que permitem sua candidatura e o TSE. A Lei não deve pretender criar pessoas honestas, mas se a pessoa desonesta for eleita, que não consiga ser ladrão", apontou Delgado. 

No primeiro painel sobre os sistemas partidário e eleitoral, o doutor em Ciências Políticas pela UFRJ, Jairo Nicolau, indicou que o sistema político e partidário em vigência no Brasil foi formado na década de 1990 e está se dissolvendo agora, pois a maioria dos partidos se distanciou da sociedade para se manter no poder. "Porém, a reforma política que queremos, talvez, não encontre o terreno político ideal neste momento para acontecer. Existe uma comissão de reforma política, que está na segunda composição deste novo governo, que tem até setembro para deliberar uma proposta de curto prazo para garantir as eleições de 2018. E é nisso que devemos nos preocupar a curto prazo", afirmou. Segundo Nicolau, existem dois grandes desafios para as eleições de 2018, que são a redução da fragmentação partidária e o novo sistema de financiamento das campanhas eleitorais. "Minhas propostas para o fim da fragmentação política seriam a criação de uma cláusula de barreira de 1,5%; o fim das coligações; a possibilidade de que os partidos que não atingiram o quociente eleitoral participem da distribuição das sobras; e horário eleitoral gratuito e Fundo Partidário para os partidos com mais de 1,5%", concluiu. Já para regular o financiamento de campanha, Nicolau acredita que a saída seja aumentar o Fundo Partidário em ano eleitoral, com especificação de despesas por cargo, estabelecer limites de gastos por pessoas físicas e autofinanciamento (R$ 100 mil e R$ 200 mil), adoção de um modelo de prestação de contas on-line, estabelecer limites de gastos, relativamente às eleições de 2014 e dedução no imposto de renda de doações reduzidas (R$ 2 mil). 

Para o professor de ciência política da USP, José Álvaro Moisés, a crise política brasileira começou após as eleições de 2014, quando a presidente Dilma Roussef não foi capaz de organizar sua base para coordenar o País. "Além disso, a crise revelou outras muitas crises como a da representatividade, com o número excessivo de partidos políticos. A governabilidade não deve ser vista como a capacidade de os partidos ajudarem o governo, mas sim se eles de fato representam seus eleitores", afirmou. Segundo Moisés, o País vive também uma carência de lideranças políticas, que são desencorajadas pelo sistema vigente. "A Constituição permitiu que os partidos pudessem se constituir de maneira que se apropriassem do horário eleitoral gratuito, do fundo partidário e isso só faz com que eles se mantenham no poder pelo poder. O estímulo à liderança ficou comprometida pelo negócio que a política se tornou", apontou. Por fim, Moisés acredita que mesmo não sendo o momento mais tranquilo politicamente para discutir a reforma política, o País deve aproveitar a oportunidade para que se mude, pelo menos um pouco, o sistema político. 

A assimetria entre o poder político dos Estados brasileiros também foi objeto de discussão no painel, levantado pelo professor da FGV, José Eduardo Faria, que acredita que os estados mais desenvolvidos economicamente, socialmente e culturalmente deveria ter um maior protagonismo nacional para realizarem as reformas públicas que o País necessita. "O problema que vemos é a divisão do poder entre os Estados brasileiros que são distintos populacional e economicamente, mas que pelo sistema eleitoral em vigor, os Estados menos desenvolvidos têm mais poderes, pois são maioria, do que os Estados que de fato são desenvolvidos e poderiam contribuir de maneira palpável para o País. Temos dois Brasis: um mais desenvolvido, mas politicamente mais fraco e um Brasil menos desenvolvido, porém politicamente forte", apontou. 

Caminhos para o futuro

O segundo e último painel levantou os caminhos para a representatividade política para as eleições de 2018. Para o fundador do Movimento Vem Pra Rua (MVPR), Rogerio Chequer, o sistema corrupto de financiamento de campanha é a raiz da problemática política do Brasil, pois é responsável pela manutenção dos políticos no poder. "Falamos muito sobre o volume dos gastos públicos, mas esquecemos o destino que ele tem, porque os partidos não gastam bilhões de reais com panfletos. A maior parte do uso deste dinheiro vai para a compra dos prefeitos e de outros líderes regionais, que funcionam como voto distrital para os candidatos", afirmou. Para quebrar o círculo vicioso da reeleição e da dependência do dinheiro público, Chequer acredita que o fim da continuidade de mandato, o financiamento de campanha feita pelos próprios militantes de cada partido (que eliminaria os partidos que se alimentam apenas do Fundo Partidário) e o equilíbrio dos poderes entre os Estados pelo voto distrital, seriam fundamentais para garantir uma oxigenação permanente da política e das suas práticas. 

Segundo o diretor-presidente do Centro de Liderança Pública (CLP), Luiz Felipe d'Avila, não haverá renovação política enquanto as regras atuais não mudarem. "Para mudá-las, precisamos entender quais são os valores que queremos e depois disso, passar a responsabilizar os políticos pelo voto distrital, para o eleitor poder cobrar e fiscalizar melhor", apontou. O voto majoritário também deve ser adotado na Câmara, na visão de d'Avila, para não acontecer mais casos de o eleitor votar em um candidato e eleger por tabela outra figura completamente diferente dos seus valores. Apesar do sistema ainda não ter sido alterado, d'Avila acredita que as pessoas estão se mobilizando e existe a formação de novas lideranças regionais, porém, não têm o espaço necessário da mídia para serem conhecidos. 

O desafio, de acordo com o membro do Insper, Milton Seligman, é realizar as mudanças, mesmo que mínimas, para impactar já nas eleições de 2018. A reforma política é um processo, e não a mãe de todos os processos, que continuará em andamento pós uma primeira mudança. A questão mais dramática talvez seja fazer o voto distrital até 2018. Não há tempo hábil para explicar à população como o sistema funciona e sua importância. Mas será que nenhum Estado pode servir de modelo para testar este modelo? Se o resultado for positivo, podemos aplicar de maneira macro para todo o País", apontou. Sobre a formação de novas lideranças, Seligman, se diz otimista e acredita que existam novas figuras políticas com potencial para liderar, porém, aponta também que o momento atual de incredulidade da população com a política exige cautela, pois assim como ocorreu nos Estados Unidos, o Brasil pode eleger seu próprio Donald Trump ou outro populista extremo.

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