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Editorial

A COP-30 em Belém: sonhos e realidades

É pouco provável que os US$ 300 bilhões anuais para financiamento climático aumentem. Mas se pode tentar aumentar a parcela que virá de recursos públicos e fundos concessionais

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A COP-30 em Belém: sonhos e realidades
O que se espera é que a COP-30, em Belém, sob a presidência do Brasil, melhore esse quadro (Arte: TUTU)

Por José Goldemberg*

A Convenção do Clima adotada em 1992 no Rio de Janeiro estabeleceu que os países desenvolvidos “proverão recursos financeiros novos e adicionais aos países em desenvolvimento” para cobrir os custos totais das suas obrigações previstas na convenção.

A quantificação desses recursos só foi definida 17 anos depois, em 2009, na reunião dos países signatários da convenção em Copenhague (COP-15), e foi fixada em US$ 100 bilhões por ano. Desembolsos reais demoraram a se concretizar, e esse valor só foi atingido em 2022.

Uma análise completa deles foi realizada e se constatou que apenas cerca de 30% dos recursos foram transferidos sob a forma de fundos concessionais. O restante veio de empréstimos de bancos multinacionais (públicos ou privados), o que tornou seu acesso muito difícil para os países mais pobres já extremamente endividados com outros empréstimos.

Amargas discussões sobre esse tema ocorreram ao longo dos anos e decidiu-se que a COP-29, em Baku (Azerbaijão), realizada em novembro de 2024, seria dedicada a finanças e revisaria a decisão tomada em 2009.

As expectativas eram altas e foram quantificadas. O Comitê de Finanças do Secretariado da Comissão do Clima estimou que seriam necessários de US$ 5 trilhões a US$ 7 trilhões, de 2022 a 2030, para cumprir os compromissos assumidos pelos governos nas suas comunicações nacionais. Isso corresponde a US$ 455 bilhões-US$ 585 bilhões por ano.

Outros estudos apontavam para recursos ainda maiores: US$ 300 bilhões por ano para adaptação, US$ 300 bilhões por ano para mitigação e US$ 400 bilhões por ano para perdas e danos resultantes do aquecimento global.

As negociações para adotar um valor satisfatório se arrastaram durante toda a duração da COP-29 (11 a 22 de novembro), provavelmente aguardando a orientação do G-20 (cujos países representam cerca de 85% da economia mundial), que se reuniu no Rio de Janeiro no mesmo mês (18 a 19 de novembro).

O comunicado final do G-20 tratou o aquecimento global com “negligência benigna”, recomendando apenas “um aumento rápido do financiamento global de bilhões para trilhões de dólares”.

Diante do risco iminente do fracasso, o presidente da COP-29, na sessão de encerramento, apresentou como decisão final – sem ouvir o plenário – “adotar a meta de (pelo menos) US$ 300 bilhões por ano até 2035 para financiamento climático de uma variedade de fontes públicas e privadas, bilaterais e multilaterais, incluindo alternativas”.

Com isso foi evitado um fracasso completo da COP-29, como ocorreu recentemente com a Convenção da Biodiversidade e a Convenção de Combate à Desertificação.

Vários países registraram restrições à declaração lamentando a falta de ambição de uma alocação mínima de recursos para os países menos desenvolvidos e a ausência de diretrizes para progressos na transição energética. Foi lembrado ainda que a China, maior emissor (30% das emissões mundiais), deveria também contribuir.

Essa é a realidade que destruiu os sonhos dos ambientalistas e do próprio secretário-geral das Nações Unidas, que alertou a conferência em Baku que auxiliar os países em desenvolvimento a reduzir suas emissões não é caridade, mas do próprio interesse dos países mais ricos, evitando que eles se tornem grandes emissores como a China.

O que se espera é que a COP-30, em Belém, sob a presidência do Brasil, melhore esse quadro. É pouco provável, contudo, que os US$ 300 bilhões por ano até 2035 para financiamento climático aumentem porque a eleição de Donald Trump vai reduzir a participação dos Estados Unidos no processo. Ao contrário, a inflação mundial vai reduzir o valor real dos US$ 300 bilhões ao nível atual. O que pode ser melhorado é tentar aumentar a parcela que virá de recursos públicos a baixos juros e fundos concessionais.

Afora isso, o único aspecto positivo das negociações do clima que se pode vislumbrar é o número crescente de países e entidades internacionais que regulam as emissões de carbono: 24% das emissões globais são hoje objeto dessa regulação. Isso pode ser feito através de taxas sobre as emissões de carbono (como fazem os países escandinavos) ou pelo mercado regulado de emissões, em que os governos fixam o nível máximo das emissões de cada setor (ou empreendimento) e criam com isso um mercado para compra e venda de créditos de carbono, como o Brasil acaba de fazer.

Existem cerca de 40 mil cidades no mundo (com população maior que 100 mil habitantes) que são sede de municípios ou entidades regionais. À medida que mais prefeitos ou autoridades regionais adotem esses mecanismos, o setor regulado de emissões aumentará muito.

No limite, teríamos um mecanismo controlador das emissões de carbono como o que existe hoje para emissões que comprometem a qualidade do ar, como óxidos de enxofre, e que são controladas por entidades tipo a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb).

Essa é uma solução “de baixo para cima”, que vai aos poucos complementando a solução dos acordos internacionais “de cima para baixo”, que, como vimos na COP-29, em Baku, não é muito encorajadora.

* José Goldemberg é presidente do Conselho de Sustentabilidade da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), presidiu a Eletropaulo entre 1982 e 1985, e foi ministro do Meio Ambiente em 1992 (governo Collor).

Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo em 27 de janeiro de 2025.

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