Editorial
03/12/2024A disparada do dólar e seus impactos no turismo
Análise aponta que a moeda continuará em um processo de valorização, enquanto o real deve permanecer desvalorizado, ao menos no curto e médio prazo
Por Guilherme Dietze*
A moeda brasileira tem enfrentado um processo de desvalorização nos últimos meses e, recentemente, chegou a disparar, superando o patamar de R$ 6 por dólar. É importante compreender que duas forças principais estão contribuindo para esse cenário. A primeira, fora do controle interno, é a valorização global do dólar frente a uma cesta de moedas, reflexo da expectativa de que a taxa de juros nos Estados Unidos permanecerá elevada por mais tempo do que o previsto, além da possibilidade de políticas protecionistas por parte do presidente eleito, Donald Trump, visando estimular a economia americana.
Por outro lado, há uma causa doméstica que também tem contribuído para a desvalorização da moeda nacional: a dificuldade do governo em apresentar um ajuste fiscal crível. No final de novembro, o ministro da Economia anunciou propostas que, em parte, vão na contramão, como o aumento de impostos para os chamados “super-ricos”, com o objetivo de compensar a ampliação da isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil.
Dessa forma, a análise aponta que o dólar continuará em um processo de valorização, enquanto o real deve permanecer desvalorizado, ao menos no curto e médio prazo.
E quais são os impactos dessa alta do dólar no setor de turismo? A princípio, pode-se pensar que haverá um efeito de substituição, incentivando viagens domésticas em vez de internacionais devido aos custos mais altos, beneficiando o turismo nacional. Em parte, isso é verdade. Contudo, os efeitos negativos da alta do dólar superam os positivos.
Brasileiros que viajam ao exterior conseguem, atualmente, realizar grande parte das compras de serviços em reais e de forma parcelada. Assim, os custos adicionais restringem-se à alimentação local, compras e outros gastos no destino, que nem sempre são decisivos para cancelar a viagem internacional.
Outro possível impacto positivo seria o aumento da atratividade do Brasil para turistas internacionais devido à desvalorização do real. No entanto, os preços elevados no país, especialmente das passagens aéreas, aliados a fatores como barreiras linguísticas, sensação de insegurança e distâncias significativas, ainda mantêm o Brasil como uma escolha secundária para muitos viajantes estrangeiros.
No âmbito doméstico, o dólar pressionará ainda mais os preços dos serviços e dificultará investimentos no setor. Na aviação, por exemplo, 60% dos custos são atrelados à moeda americana, como combustível, leasing das aeronaves e peças. Além disso, mesmo com isenções para a importação de equipamentos para parques temáticos e aquáticos, a alta do dólar encarece esses produtos, inviabilizando alguns projetos de investimento no setor.
Além disso, o dólar mais caro também encarece alimentos importados ou com preços atrelados à moeda norte-americana, afetando restaurantes e serviços de alimentação em meios de hospedagem.
Com o aumento de preços, o consumidor tende a adaptar suas escolhas. Se uma viagem ao Nordeste, por exemplo, torna-se inviável, muitas famílias optam por destinos mais próximos, acessíveis de carro, mantendo a qualidade dos meios de hospedagem.
Alguns setores e regiões são mais afetados que outros pela alta do dólar. Contudo, trata-se de um reflexo febril da economia, indicando que, em algum momento, todos serão impactados caso os problemas estruturais, especialmente o ajuste fiscal, não sejam resolvidos.
Portanto, o atual cenário de turbulência e desvalorização do real gera preocupações para o turismo brasileiro, mesmo em um momento de recorde de faturamento no setor. É importante celebrar o aumento da demanda, mas a elevação dos custos para consumidores e empresas reforça a necessidade de soluções estruturais para garantir a sustentabilidade do crescimento.
* Guilherme Dietze é economista e presidente do Conselho de Turismo da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
Artigo originalmente publicado no portal HotelierNews em 29 de novembro de 2024.
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