Economia
09/06/2025Ao criarem sistema regulador do comércio mundial, os Estados Unidos não previam a ascensão da China
Em entrevista ao Canal UM BRASIL, o professor analisa as origens da ascensão chinesa, as recentes políticas de Donald Trump e a perda de influência da União Europeia

A China começou a dominar os mercados do planeta a partir de 2001, com a sua entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC). A ascensão não foi prevista pelos Estados Unidos, explica Tanguy Baghdadi, professor de Política Internacional e fundador do podcast Petit Journal.
“Em 2008, apenas sete anos depois, a potência do Norte olha para aquela estrutura e percebe que esta não os beneficia”, afirma. Nesse momento, é como se a potência norte-americana percebesse: “Nós quebramos, e a China está ótima”, supõe Baghdadi.
Em entrevista ao Canal UM BRASIL — uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) —, o professor analisa as origens da ascensão chinesa no comércio internacional, as recentes políticas de Donald Trump e a perda de influência da União Europeia em um mundo que vive a ascensão de novas potências.
A entrevista foi realizada em parceria com o Ibmec.
Questão chinesa
- Sistema Internacional. Criada em 1994 pelos Estados Unidos, no âmbito da nova ordem mundial, a OMC inaugurou um sistema, com regras e garantias de segurança, que passou a regular as trocas comerciais entre as nações. Baghdadi destaca que o país norte-americano não imaginava que a organização passaria a beneficiar a China, arriscando a própria soberania.
- Novo ‘player’. “A China, naquele momento, era uma economia absolutamente secundária, um eterno país do futuro”, analisa o professor. “Mas, no momento em que entra na OMC, na ordem liberal criada pelos Estados Unidos, começa a dominar os mercados.” Essa escalada pode ser contada em números. Em 2000, o Produto Interno Bruto (PIB) chinês era de US$ 1,2 trilhão. Com crescimento anual de 8% a 14% entre 2001 e 2010, o PIB disparou, chegando a US$ 6 trilhões em 2010. Isto é, em uma década, a economia da nação asiática cresceu cinco vezes. Já o PIB per capita foi de US$ 1.053, em 2001, para US$ 4,55 mil em 2010, segundo dados oficiais.
- Crise de 2008. De acordo com Baghdadi, é só no fim da década de 2000 que os estadunidenses percebem que a organização foi importante para a ascensão da China. “A crise de 2008, que antecede Donald Trump, é o momento no qual os Estados Unidos olham para esse sistema liberal e percebem que não foram os grandes beneficiários dessa estrutura toda”, completa.
Modo Trump de governar
- Os ‘não globalizados’. Em meio à escalada das políticas anti-imigração nos Estado Unidos, Baghdadi observa que uma das estratégias de Trump é a aproximação com a população “não globalizada” — um grupo ligado a valores tradicionais, mais intolerante às diferenças, mais provinciano e conservador e que “perdeu o emprego para a globalização”, descreve o professor. “Trump entende que aí existe uma brecha importante”, explica.
- Na mira dos holofotes. Outro aspecto observado por Baghdadi é que o presidente estadunidense opera “como se fosse um apresentador de reality show”. “Ele governa garantindo que você vá ficar no próximo bloco”, ironiza o professor. “Numa semana taxa a China; na semana seguinte é o Brasil; na outra, a Austrália, a União Europeia, a China (de novo), a Rússia etc.”, completa. Para Baghdadi, é assim que Trump mantém as atenções do mundo voltadas para o país o tempo todo.
União Europeia
- Perda de influência. Com a ascensão de novas potências globais, Baghdadi afirma que, mesmo existindo como bloco, a União Europeia passa por um processo de enfraquecimento como protagonista mundial. “Há um problema grave do ponto de vista estrutural: a Europa está perdendo relevância”, opina. “O continente vai continuar sendo muito interessante, muito rico e relativamente influente, mas essa influência será cada vez menor”, observa.
- Em declínio. A opinião do professor é respaldada por números. No ano 2000, os países da zona do euro representavam quase 20% da economia do planeta — e a China, menos de 4%. Em 2023, a participação chinesa saltou para 17%, enquanto a dos países da zona do euro encolheu para menos de 15%. Desde o início do século, a economia dessa região cresceu, em média, 1,27% ao ano (a.a.), enquanto a taxa de crescimento chinesa foi de 8,24% a.a., segundo dados do Trading Economics.
Assista ao debate na íntegra.