Editorial
18/10/2018As empresas e as novas medidas contra a corrupção, por Carlos Lima
Segundo o membro da força-tarefa da Lava Jato, compliance é um elemento essencial para o sucesso e a preservação da imagem das empresas
Após a eclosão da Lava Jato, agir de modo ilegal pode pôr em risco a manutenção de uma empresa, diz Carlos Lima
(Arte/Tutu)
Por Carlos Lima
Corrupção, peculato, fraude, são características que existem por todo o lado. É, lamentavelmente, a forma como a natureza humana funciona, quer queiramos ou não. O que economias bem-sucedidas fazem é mantê-las no mínimo. Ninguém alguma vez conseguiu eliminar qualquer dessas coisas.” Essa afirmação de Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve americano (Fed), baseia-se na célebre concepção de Thomas Hobbes de que o “homem é o lobo do próprio homem”.
Ironicamente, se por um lado sua crença na natureza egoísta das pessoas encontra respaldo na história, Greenspan estava errado em acreditar que conseguiria manter sempre essa natureza humana sob controle. E foi justamente a certeza da autorregulamentação do mercado financeiro, contraditória à sua própria visão do ser humano, um dos fatores que levou à crise de 2007/2008.
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Na verdade, se a história mostra momentos de egoísmo extremo, em outros, o ser humano demonstra extrema compaixão por seus semelhantes, o que nos torna nem lobos de nossa própria espécie, nem anjos ou bons selvagens, mas seres contraditórios, movidos pelas circunstâncias positivas ou negativas que surgem na vida de cada um.
Diante dessa nossa natureza contraditória, não resta outra alternativa para a organização da sociedade – especialmente em economias complexas como as das nações ocidentais – que não seja a proibição pela lei de condutas predatórias daqueles que possuem algum poder. Nesse sentido, em relação às práticas corruptas, às práticas desleais, especialmente considerando o poder que as autoridades públicas e empresas possuem na vida das pessoas comuns, é impositivo que haja o seu controle.
Com esse fim, a sociedade brasileira encampou as Dez Medidas Contra a Corrupção, que previam principalmente o aperfeiçoamento das leis penais e processuais penais, com o objetivo de tornar mais eficiente o combate aos crimes de corrupção. Infelizmente, essas medidas, apoiadas por mais de 2,3 milhões de cidadãos, foram sepultadas em uma noite pela Câmara dos Deputados.
Entretanto, se o velho modo de pensar ainda não morreu, é inevitável que o novo prevaleça. Dessa forma, sob a liderança da Transparência Internacional e apoiada por instituições como a Fundação Getulio Vargas (FGV) e o Observatório Social, novas medidas contra a corrupção foram apresentadas para a sociedade. Agora, o objetivo é transformar o apoio a essas medidas como um dos fatores principais para a escolha dos candidatos nas próximas eleições.
As chamadas “Novas Medidas contra a Corrupção” são bem mais amplas que as anteriores, incluindo também incentivos para o estabelecimento de programas de compliance efetivos pelas empresas. Assim, reconhecendo‑se a importância das empresas para ambientes econômico e político mais limpos, são essas as convidadas a participar desse esforço da sociedade brasileira.
Compliance, portanto, veio para ficar, como um elemento essencial para o sucesso das empresas, mas também como um elemento importante para a preservação da imagem e da própria existência da empresa. Hoje, em tempos de Lava Jato, agir de modo ilegal, como foi descoberto pela operação, pode significar risco para a manutenção do negócio.
Aqui fica o convite para todos os setores econômicos apoiarem as Novas Medidas contra a Corrupção, bem como se engajarem efetivamente na implementação de programas de compliance efetivos, com engajamento de toda a organização, treinamentos constantes de todos os stakeholders e continuidade do compromisso com a honestidade e a transparência, pois, como vimos, é preciso sempre estarmos atentos à natureza humana.
*Carlos Fernando Dos Santos Lima e procurador regional da República e membro da força‑tarefa Lava Jato
Artigo publicado na revista Problemas Brasileiros, edição especial de setembro de 2018.
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