Editorial
06/11/2023Banco Central acerta na queda, mas enfrenta cenário desafiador
Especialista comenta sobre a taxa de juros definida pelo BC
Por André Sacconato*
Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o Banco Central (Bacen) reduziu a taxa de juros para 12,25% ao ano (a.a.), conforme esperado pelo mercado. Antes disso, alguns analistas chegaram a cogitar um corte de 0,75 ponto porcentual (p.p.), mas o comitê optou por uma decisão mais cautelosa.
Enquanto as condições inflacionárias sinalizam melhorias e um cenário mais favorável, incertezas fiscais e no âmbito internacional impedem o Bacen de ações mais ousadas. Mais uma vez, a decisão foi equilibrada e ponderada.
Dentre as boas notícias, destaca-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que está convergindo para dentro da meta. O indicador acumulado no ano até setembro foi de 3,5%, enquanto nos últimos 12 meses, de 5,19%. Segundo as expectativas do mercado, divulgadas no último boletim Focus, o IPCA pode encerrar o ano em 4,63%.
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O setor de alimentação continua contribuindo para o processo desinflacionário, com fortes quedas em agosto e setembro (respectivamente, -0,85% e -0,71%), principalmente entre os alimentos para o consumo doméstico, impactando mais a população mais pobre.
Outro indicador positivo para o Bacen são os núcleos, que excluem os preços mais voláteis e refletem o aquecimento da demanda, que permanecem muito comportados. A média desses núcleos em setembro foi de 0,21% (3,8% ao ano), além do índice de serviços, que se aproximava de 0,3%.
Vale ressaltar que, em últimas atas e comunicados, a autoridade monetária ressaltou a sua atenção a essas informações, as quais foram corroboradas pelo IPCA-15 de outubro. Por outro lado, outros dados exigem cautela do comitê.
A Secretaria do Tesouro apontou que o déficit primário do governo já atingiu quase R$ 94 bilhões até setembro. Mesmo com a Lei Orçamentária permitindo um déficit de R$ 228 bilhões, já tinha sido prometido que esses gastos não passariam dos R$ 100 bilhões.
Além disso, a outra promessa era a de zerar o déficit em 2024, dentro do contingenciamento orçamentário, mas ainda faltariam R$ 168 bilhões em receitas adicionais para cumprir essa meta, muito difícil de se concretizar.
E para piorar esse sentimento negativo, o próprio presidente deu declarações que não demonstram um comprometimento claro com as metas fiscais, gerando mais incertezas no mercado. A política fiscal continua expansionista, exigindo uma política monetária mais conservadora.
Ainda, no cenário externo, as projeções não estão otimistas. Apesar da desaceleração do crescimento chinês, que poderia facilitar o trabalho da política financeira, o fortalecimento da economia dos Estados Unidos e as taxas de juros dos T-Bonds (Treasury Bonds), juntamente com a falta de controle fiscal, sinalizam a intensificação das quedas.
O conflito entre Hamas e Israel adiciona uma indefinição sobre os conflitos em curso, reforçando a preocupação com os preços dos combustíveis, que, antes, não representavam uma pressão relevante.
Em resumo, ainda há espaço para novos cortes das taxas de juros, mas a falta de compromisso do governo com a responsabilidade fiscal e a sensibilidade do cenário externo impedem uma redução maior do que 0,5 p.p.
O grande problema a ser vislumbrado é que se não houver uma mudança na política fiscal, o número de cortes possíveis ao Bacen pelo cenário pode diminuir, e o patamar da taxa da Selic corre o risco de ficar mais alto. Péssima notícia para o setor produtivo do País, mas ainda há tempo de mudar.
*André Sacconato é economista, consultor da FecomercioSP e integrante do CEEP.
Artigo originalmente publicado no Portal Contábeis em 2 de novembro de 2023.
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