Legislação
02/08/2021Brasil precisa incluir ciência na administração tributária para modernizar sistema sem crivo ideológico
Opinião é do presidente da Afresp, Carlos Leony Fonseca da Cunha, durante reunião do Codecon-SP
Já nos países da OCDE, as administrações tributárias procuram engajar os contribuintes evitando que deixem de pagar os tributos
(Arte: TUTU)
Por Filipe Lopes
Os caminhos para melhorar o ambiente de negócios no Brasil por meio da simplificação do sistema tributário foi tema da reunião do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte de São Paulo (Codecon-SP), que aconteceu virtualmente na última quinta-feira (29), contando com as apresentações de Carlos Leony Fonseca da Cunha, presidente da Associação dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Afresp) e Fábio Verbicário, auditor fiscal do Rio de Janeiro. A reunião foi mediada por Valdete Marinheiro, vice-presidente do Codecon-SP.
Qual é o papel da administração tributária? Provavelmente muitos contribuintes brasileiros já devem ter feito este questionamento, chegando à conclusão de que a atividade serve para garantir o pagamento dos impostos. Esta percepção de “Fisco cobrador” é completamente diferente do propósito das administrações públicas dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que focam as ações na manutenção do ambiente de negócios, com regras claras, medidas preventivas contra devedores, constantes ações de desburocratização do sistema e relacionamento próximo ao contribuinte.
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A constatação é resultado de uma ampla pesquisa realizada pelo auditor fiscal Fábio Verbicário, que consultou mais de 200 estudos e pesquisas realizadas pela OCDE e pelo Centro Interamericano de Administrações Tributarias (CIAT), desde o início da década de 2000 até os dias atuais. “A proteção do ambiente de negócios é prioridade nas administrações tributárias mundo afora, muito diferente da realidade brasileira”, apontou.
Para o presidente da Afresp, assim como ocorreu durante a pandemia de covid-19, a ciência deve sobrepujar questões ideológicas ou argumentos poucos alinhados à realidade dos fatos, inclusive no debate sobre a modernização da administração tributária nacional. “O Brasil precisa incluir a ciência na administração tributária para modernizar o sistema, sem crivo ideológico. Um modelo que gere uma dívida ativa de 73% do Produto Interno Bruto (PIB) significa que está complemente errado”, aponta Cunha, que afirmou ainda que “enquanto o País não discutir o tema de maneira científica, não chegará a lugar nenhum”.
Gestão do débito tributário
Uma das grandes diferenças entre as administrações tributárias estrangeiras e a brasileira é a forma como lidam com os débitos. No Brasil, mesmo em situação de inadimplência, os maus pagadores continuam atuando no mercado até que as questões sejam resolvidas na Justiça, com a possibilidade, inclusive, de ingressarem em programas de negociações de dívidas com descontos e outras facilidades. Esta realidade provoca um sentimento de injustiça entre os contribuintes idôneos e um desequilíbrio concorrencial no mercado.
Já nos países da OCDE, as administrações tributárias procuram engajar os contribuintes evitando que deixem de pagar os tributos. “É deixar claro o que se espera do contribuinte, bem como manter os esforços voltados à comunicação ativa e personalizada, para minimizar os riscos de não pagamento”, destacou Verbicário.
Os contribuintes que começam a demonstrar dificuldades no cumprimento das obrigações tributárias são incentivados constantemente à autorregulação e à manutenção do diálogo aberto com os fiscos, buscando meios efetivos que garantam o recolhimento dos impostos. Mesmo quando não há possibilidade de evitar a dívida tributária, os países da OCDE procuram formas amigáveis de solucionar os débitos, com acordo e planos de pagamento, com o objetivo de se livrarem das ferramentas mais severas de punição, como penhora, falência e responsabilização de sócios e diretores.
“Não é racional para o ambiente de negócios permitir que contribuintes inadimplentes continuem competindo no mercado com os outros, que são onerados pelo Fisco e, depois, recebem o benefício do perdão da dívida”, ponderou Verbicário.
Apesar da enorme distância entre a realidade brasileira e os países da OCDE, Verbicário ainda destacou que existe espaço para melhorar a administração tributária nacional, porém, desde que haja colaboração de todos. “A OCDE recomenda que a administração tributária atue para personalizar as ações, especialmente em segmentos com alto risco de descumprimento, além de simplificar a legislação para facilitar a conformidade tributária. Com regras claras e envolvimento dos contribuintes, o ambiente de negócios é preservado, e desperta interesse de mais investidores”, conclui.
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