Economia
24/05/2024Brasil precisa melhorar a produtividade e a integração comercial
As reformas ajudam, mas o grande desafio é melhorar o ambiente de negócios e a infraestrutura para que o País volte a crescer de forma sistemática e consistente
Passada a agenda da regulamentação da Reforma Tributária, que deve ser debatida em um prazo de até 50 dias, de acordo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP/AL), o Brasil precisa olhar com atenção e enfrentar outras duas questões: a melhoria da produtividade e a integração comercial. O alerta é do economista-chefe da XP Investimentos, Caio Megale, em entrevista ao Canal UM BRASIL, uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
O desafio para melhorar a produtividade deve ser enfrentado tanto na esfera privada quanto no setor público, uma vez que é necessário gerar um ambiente de negócios propício para que floresça a inovação no ambiente econômico. Estabilidade macroeconômica, juros baixos e acessos ao crédito e a boas escolas básicas e universidades são os pilares que precisam ser aprimorados para criar as condições para o Brasil avançar. “Atualmente, ao vermos uma empresa brasileira fazendo sucesso, pensamos, primeiro, que o empreendedor é um herói, porque precisa passar por cima de uma série de adversidades. No entanto, o papel do setor público é justamente reduzir essas adversidades e criar um ambiente de negócios mais favorável para o crescimento e a inovação”, comenta Megale.
O ex-secretário de Desenvolvimento da Indústria e Comércio pondera que essa criação em âmbito empresarial vai além de melhorar as questões macroeconômicas. Um dos fatores que afeta diretamente a produtividade nacional é a violência e a insegurança. “Uma empresa precisa gastar, atualmente, muito mais com segurança para tocar a sua produção, o que inclui a área de Transportes. E esse desembolso gera custo e dificuldade para o Brasil crescer”, adverte.
Já a pauta da integração comercial, pontua Megale, tem de voltar a ser discutida — e o País precisa abrir a economia e reduzir tarifas. O economista enxerga com preocupação a tendência de adoção de medidas antidumping e protecionistas. “São ações paliativas. O que pode trazer resultado positivo no curto prazo, quando se analisa só o sintoma e não a raiz do problema, só serve para perpetuar uma questão estrutural. Acho que vivemos isso no Brasil desde que nasci, há 50 anos, pelos menos.”
Megale ainda ressalta que a receita composta por proteção excessiva e tarifas comerciais elevadas, com baixa integração com o comércio internacional, prejudicam a produtividade doméstica a longo prazo. “Como o Brasil é muito grande, com mercado interno forte, muitos pensam que podemos resolver tudo sozinhos e não precisamos importar e exportar, que é só vender grãos, petróleo e minério de ferro, e nos viramos com o resto. No entanto, essa não é uma boa prática, pois perdemos produtividade e boas ideias vindas de fora. Além disso, os produtos acabam chegando muito caros por aqui.”
Outro gargalo é a deficiência da infraestrutura em portos, aeroportos e estradas. “Melhorou nos últimos anos, mas continua sendo um desafio. No Estado de São Paulo, por exemplo, temos boas estradas, mas essa não é a realidade em todo o País. Dispomos de poucas ferrovias e transporte naval. E mesmo no transporte rodoviário, a frota de caminhões é antiga.”
No âmbito da tecnologia e inovação, falta conexão entre as pesquisas acadêmica e aplicada, especialmente nas pequenas e médias empresas. “O Brasil tem um estudo acadêmico muito forte, mas essas pesquisas não se traduzem, necessariamente, em melhor produtividade da economia.”
Modernizações no ambiente de negócios e na infraestrutura
Sobre as reformas realizadas desde o governo Michel Temer (2016–2018), Megale avalia que a Trabalhista foi muito importante, porque melhorou o relacionamento entre as empresas e os trabalhadores e a viabilidade de serviços, que eram engessados e complexos. O aprimoramento de marcos legais e a ampliação de concessões e privatizações abriram espaço para o setor privado investir em áreas que, historicamente, eram blindadas pelo setor público. Já a Reforma da Previdência, por sua vez, melhorou a flexibilidade dentro do orçamento e abriu espaço para o setor privado fazer novos investimentos.
O que falta, ressalta Megale, é completar a Reforma Tributária, que só vai obter sucesso se o Brasil for capaz de conter e melhorar a estabilidade e a eficiência dos gastos públicos para que não haja a necessidade de continuar buscando novas receitas e fontes de arrecadação, as quais acabam distorcendo a economia. “A reforma precisa, de fato, ser efetiva, e não forçar o País a voltar a criar novos penduricalhos tributários para pagar os gastos.”
O economista-chefe da XP Investimentos observa que a dinâmica dos gastos públicos obrigatórios é muito acelerada, com regras que fazem com que a maior parte desses desembolsos cresça acima da inflação, como é o caso de indexações e obrigações vinculadas aos pisos constitucionais e às diversas despesas atreladas ao salário mínimo e ao crescimento da economia. “Quando se obriga uma despesa a seguir uma determinada direção, naturalmente se diminui o incentivo à boa aplicação dos recursos. O velho DDD [desobrigar, desvincular e desindexar] é fundamental para que exista capacidade de aplicar os gastos públicos de forma organizada e eficiente.”
De acordo com Megale, as reformas ajudam, mas o grande desafio é melhorar o ambiente de negócios e a infraestrutura para que o Brasil volte a crescer de forma sistemática e consistente. “Se não trouxermos essas agendas para a pauta, o País vai continuar com esse freio na economia e registrando voos de galinha.” O crescimento da economia nacional está distante em relação a outros países emergentes da Ásia, da Europa e até de alguns da América Latina, que crescem de 5% a 7% ao ano e se aproximam da fronteira do crescimento global. Já o Brasil tem avançado, em média, de 1% a 2% nas últimas décadas. O economista também aponta que vários fatores explicam esse baixo crescimento, sobretudo as deficiências de capitais humano, físico e tecnológico. “Apesar de ter evoluído na educação nos últimos governos, o capital humano deixa a desejar, e ainda temos uma qualidade da educação muito baixa para conseguir absorver todas as tecnologias globais”, conclui.
Assista, a seguir, à entrevista na íntegra.
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