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Negócios

Com Biden na Casa Branca, relação do Brasil com os Estados Unidos dependerá de ações propositivas do Itamaraty

Especialistas indicam que País não está entre as prioridades do governo democrata, mas agenda ambiental deve ser cobrada

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Com Biden na Casa Branca, relação do Brasil com os Estados Unidos dependerá de ações propositivas do Itamaraty

Ideologização da política externa preocupa especialistas sobre o modo com que o Itamaraty se relacionará com o governo Biden
(Arte/Tutu) 

Por Eduardo Vasconcelos

A partir de 20 de janeiro de 2021, quando Joe Biden assumir a Casa Branca, os Estados Unidos devem voltar a reforçar as agendas e os organismos multilaterais, reaproximar-se das nações europeias e defender políticas ambientais ao redor do mundo, sem abdicar de uma postura de contenção aos avanços comerciais e tecnológicos da China. Com exceção do México, deve restar à América Latina e, por consequência, ao Brasil, a despeito da transição presidencial, uma posição secundária na política externa norte-americana. Sendo assim, a relação entre os governos de ambos os países dependerá muito mais de ações propositivas do Itamaraty do que de uma eventual atenção da administração democrata ao Brasil.

Essa é a síntese do debate realizado pelos conselhos de Economia Empresarial e Política (CEEP) e de Relações Internacionais (CRI), da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), na quinta-feira passada (26). O encontro virtual contou com o diretor de estratégia da Arko Advice, Thiago de Aragão; o sócio-diretor da Prospectiva, Ricardo Sennes; e o jornalista e colunista da Folha de S.Paulo, Jaime Spitzcovsky.

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Na avaliação de Aragão, se os Estados Unidos serão uma ameaça ou uma oportunidade, caberá ao governo Bolsonaro, porque “o Brasil não está entre as dez, 15 ou 20 prioridades de Biden no mundo”. Ele complementou dizendo que, apesar da “afinidade” entre Donald Trump e Jair Bolsonaro, “a relação entre dois países não se dá entre presidentes”, mas por meio da “burocracia e dos interesses do setor privado de ambos os países”.

“Quando não se trata como prioridade, ocorre, normalmente, um comportamento reativo, não propositivo. Portanto, oportunidade ou ameaça dependem dos sinais enviados pelo Brasil”, indicou Aragão. “A política internacional é a única em que se pode resolver praticamente qualquer problema com um telefonema. Então, este é um cenário que depende muito mais de Bolsonaro do que de Biden”, acrescentou o mestre em Relações Internacionais.

Com uma linha de raciocínio similar, Sennes salientou que “a importância da América Latina para o governo americano sempre foi baixa e, agora, será ainda mais”, em função de a atenção, no campo internacional, estar voltada a uma política de enfrentamento da China. Contudo, um governo norte-americano mais participativo nos organismos multilaterais tende, ainda que indiretamente, a beneficiar a economia brasileira.

“O que podemos esperar do ponto de vista comercial, em um ambiente pós-Trump, é um reforço à OMC [Organização Mundial do Comércio]. Para o Brasil, é um sinal positivo. Sendo o País um ator pequeno no jogo internacional, um ambiente mais estável é sempre mais favorável”, analisou. “Entendo que o Biden não dará uma guinada [na política comercial]. Muito provavelmente ele vai seguir com o programa criado pelo Trump, o Clean Network, no qual os Estados Unidos tentam influenciar outros países a evitar tecnologias chinesas”, alertou.

Contenção à expansão chinesa na América Latina

O presidente do CRI, Rubens Medrano, apresentou um contraponto, lembrando que o presidente eleito dos Estados Unidos, quando vice de Barack Obama (2009-2017), visitou a América Latina 14 vezes. E, embora a região não pareça figurar entre as prioridades do governo democrata, a China, hoje, é o maior parceiro comercial dos países latino-americanos.

“Na questão do multilateralismo, Biden deve procurar se apoiar em todos os cantos que estiverem ao seu alcance. Com isso, acredito que os países da América Latina possam ganhar protagonismo”, apontou.

O jornalista Jaime Sptizcovisky destacou que, no dia 15 de novembro, foi formada, sob a liderança da China, a Parceria Econômica Regional Abrangente (RCEP, na sigla em inglês), o maior bloco comercial do mundo, o qual congrega 15 países da Ásia e nações banhadas pelo oceano Pacífico. O tratado foi uma resposta à Parceira Transpacífica (TPP, na sigla em inglês), acordo de livre-comércio costurado no governo Obama e que não incluía a China, mas do qual os Estados Unidos abdicaram na gestão Trump. Pequim, no entanto, já manifestou interesse em aderir ao TPP.

“A pergunta que não quer calar é qual é o posicionamento de Joe Biden em relação ao TPP; ele não se manifestou sobre isso na campanha. E é estratégico para o Brasil ter vizinhos, como Peru e Chile, integrando o TPP, mas não estamos debatendo a nossa inserção no tabuleiro Ásia-Pacífico, a região mais importante do ponto vista do dinamismo econômico no mundo”, enfatizou o ex-correspondente internacional em Pequim e Moscou.

Pauta ambiental e ideologização da política externa

O economista Antonio Lanzana, copresidente do CEEP, apontou que se espera “uma melhora do ambiente econômico com a vitória de Biden”, em função da imprevisibilidade característica do governo Trump. A expectativa, segundo Lanzana, é de que os Estados Unidos cresçam mais e, consequentemente, puxem o crescimento mundial, incluindo o do Brasil.

“A relação de Bolsonaro com Trump era mais de amizade do que de Estado para Estado – e acho que mais perdemos com isso. Agora, com Biden, acredito que vá depender muito da postura brasileira em relação à questão ambiental. Este tema deve ser objeto de discussão aqui dentro”, sinalizou Lanzana.

Sobre este assunto, Aragão complementou esclarecendo que a pauta pró-energia limpa – a qual consiste na substituição de fontes de energia fósseis por renováveis – é de longo prazo, portanto, não se limita ao atual governo brasileiro. “Transição energética não se trata de abraçar uma e abandonar a outra. É longa, não vai acabar na nossa geração. Não implica destruição de empregos da matriz econômica de energia fóssil. Dentro dessa transição, tendo possibilidades eólicas e solares, sendo um exemplo de energia elétrica, o Brasil pode se encaixar nesta narrativa de forma fantástica, mas não parece querer fazer isso”, ponderou.

De acordo com o cientista político Paulo Delgado, também copresidente do CEEP, o que impede, na atualidade, o País de ser uma voz ativa na questão ambiental é a ideologização da política externa. “A nossa diplomacia perdeu o interesse geopolítico multilateral. O governo Bolsonaro, assim como faz com o Ministério da Educação, usa o Ministério das Relações Exteriores para fazer a política dos grupos sectários que o apoiam”, resumiu.

 
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