Notamos que você possui
um ad-blocker ativo!

Para acessar todo o conteúdo dessa página (imagens, infográficos, tabelas), por favor, sugerimos que desabilite o recurso.

Sustentabilidade

Crise passageira no setor eólico pode ser explicada pelo PIB e ascensão da energia solar

Em entrevista para a Revista Problemas Brasileiros, Elbia Gannoum, presidente da ABEEólica, fala sobre os desafios que o setor atravessa e a sua relação com a expansão da energia solar

Ajustar texto A+A-

Crise passageira no setor eólico pode ser explicada pelo PIB e ascensão da energia solar

“Sou apaixonada por problemas brasileiros.” A frase, no meio de uma análise complexa sobre os impactos da energia eólica para a economia nacional, reflete bem o perfil da economista Elbia Gannoum. Presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) há mais de uma década, Elbia não deixa passar nenhuma chance de declarar o seu interesse pelas contradições do País — da potência econômica dos ventos do Rio Grande do Norte à proposta de indução ao crescimento, por meio da indústria verde, que ela acabou de mandar ao presidente Lula. “É gostando dos problemas que a gente encontra soluções”, explica à Revista Problemas Brasileiros.

Mas não é só isso. A sua trajetória pessoal — reconhecida há muito tempo no setor elétrico e, nos últimos tempos, fora dele — serve de inspiração para outras mulheres da mesma área. Filha de um servente de pedreiro e de uma lavadeira, a executiva viveu, curiosamente, sem eletricidade em casa até os 15 anos, em Ituiutaba, Minas Gerais. “Eu tinha que andar uns 15 quarteirões para chegar ao primeiro asfalto da vila, e mais uns oito para atingir a primeira rua iluminada”, lembra. 

Hoje, Elbia é um dos nomes mais relevantes de sua área de atuação e, por consequência, do mundo, pois somos o sexto maior produtor de energia eólica do planeta e temos a matriz energética mais diversificada que existe.

Nesta conversa, Elbia aborda temas difíceis — como a crise que o setor atravessa e a sua relação com a expansão da energia solar —, sem perder a paixão pela área que escolheu para trabalhar e que, pelas contas dela, poderia fornecer eletricidade para nove Brasis.

O setor eólico é muito masculino? Como é sua atuação, como mulher, nesse campo?

Sim, o setor elétrico é muito masculino. Basta pensar que eu fui a primeira economista a escrever sobre energia, lá no fim dos anos 1990. Mesmo no Ministério de Minas e Energia, quando a [então] ministra Dilma [Rousseff] me chamou para montar a assessoria [de energia eólica], éramos eu, ela e mais algumas. De três anos para cá, resultado do trabalho de diversidade e inclusão que estamos realizando, começaram a surgir mulheres em lugares diretivos. Mas eu diria que, em comparação com o setor elétrico, a indústria eólica até que é mais feminina. Talvez por ser mais moderna.

Vamos falar dessa indústria, então. Dados não oficiais apontam que os investimentos na indústria eólica caíram cerca de 35% em 2024, em comparação com o ano anterior — assim como diminuíram os gigawatts instalados. Por que isso aconteceu?

Se a economia cresce, a demanda por energia acompanha o ritmo. É isso que explica por que a [indústria] eólica cresceu tanto nos últimos 15 anos. Essa redução de investimentos aconteceu porque a economia não cresceu e, portanto, não demandou mais energia.

Mas o Brasil está crescendo há dois anos, pelo menos. São efeitos tardios da pandemia?

Energia é infraestrutura. Uma decisão tomada hoje vai surtir efeito em dois a três anos. Mas não foi a pandemia. A resposta é o crescimento pífio acumulado entre 2014 e 2022, que afetou a indústria eólica, porque esta é mais procurada quando a necessidade [elétrica] do País aumenta. Essa crise era para ter acontecido ali por volta de 2017.

E por que não aconteceu?

Porque, se o PIB cai, a queda na contratação de energia não acontece no mesmo momento. Por outro lado, quando o PIB sobe, o mercado aquece rápido. Essa situação deve continuar em 2025, 2026 e até 2027.

O que fazer enquanto isso?

Na verdade, estamos construindo uma base para a transição energética, que permitirá crescimento sustentado pelos próximos 20 ou 30 anos. Havia alguns projetos de lei pendurados no Congresso, que agora foram aprovados: o da Reforma Tributária, o do mercado de carbono, do hidrogênio verde, das eólicas offshore e do combustível do futuro, além da legislação da transição energética. O trabalho deste ano é estruturar tudo isso.

A diversificação da matriz energética depende do ritmo do Produto Interno Bruto (PIB)? 

Em condições normais de temperatura e pressão, sim. É por isso que o Brasil não pode se conformar com um crescimento normal e natural da economia. É preciso implementar uma política de aumento estrutural da demanda agregada. Induzir crescimento. Nossa capacidade de ofertar recursos energéticos é grande, não apenas de renováveis — mesmo de petróleo.

Parte importante do PIB brasileiro está atrelada ao petróleo. Isto é, a nossa chance de fazer uma transição depende do petróleo.

Tudo está atrelado. No entanto, ou seguimos sendo este país que espera crescimentos naturais ou realizamos uma política estruturada. Está tudo aqui na nossa mão. Seria transformar o Brasil como jamais foi feito na história. Eu nem costumo falar de “transição energética”, mas de “transformação energética”, porque significaria mudar não apenas a economia brasileira, mas também a sociedade — por meio da energia. Até porque, do ponto de vista de eletricidade, a transição nacional já está bem razoável. É do ponto de vista energético, do consumo, que ainda não está.

De que forma essa indução de crescimento pode ser feita, considerando a transição — ou transformação — energética?

O Brasil precisa descarbonizar commodities. O aço precisa ser mais verde, o Agronegócio precisa ser mais verde etc. A lei criada para descarbonizar já está induzindo uma demanda enorme por energia renovável — e aqui falo não apenas da eólica, mas também de biocombustível, de biometano. O País produzirá o hidrogênio verde mais barato do mundo ainda em 2030.

Fontes do setor dizem que a expansão da geração solar também segurou a ampliação da indústria eólica. Isso aconteceu, de fato? Surgiu uma certa concorrência entre elas?

Gerou um certo mal-estar, eu diria. O baixo crescimento da indústria eólica nesse período, depois de 2022, foi parcialmente absorvido pela energia solar. A geração distribuída desta última é a coisa mais fantástica que existe. A questão é somente como fazer. Se for extremamente subsidiada, sem controle e planejamento, gera prejuízos, e quem paga a conta é o consumidor.

A indústria eólica ainda paga o preço de ter uma estrutura mais cara?

Não é custo, mas escala. É diferente. A eólica é mais barata. É que, no caso da indústria solar, usa-se a mesma placa para tudo. A eólica não é assim, então a solar ganha na escala. O que é perverso nessa história é que enquanto existe uma indústria eólica nacionalizada, gerando emprego aqui e efeito multiplicador sobre o PIB, a solar está importando painel da China e gerando emprego na China.

Qual é a sua avaliação sobre os termos da recém-aprovada regulação da atividade de geração de energia eólica offshore?

Para mim, parece bastante adequada à necessidade do País de desenvolver seus primeiros projetos. Agora, virá um decreto com as diretrizes para o primeiro leilão de cessão de áreas, que nós vamos trabalhar para acontecer em 2025 ano ainda.

Qual é o potencial produtivo de energia eólica do Brasil?

O limite onshore [no continente] é de 800 gigawatts (GW). Como o Brasil tem, hoje, somando todas as fontes de eletricidade, 200 GW, só a eólica onshore abasteceria o equivalente a uma área de quatro Brasis. No caso do offshoreo limite é 1 terawatt (TW), ou cinco Brasis. Então, só de energia eólica, o potencial é de nove Brasis.

Matéria originalmente publicada no site da Revista Problemas Brasileiros, uma realização da Federação.

A FecomercioSP acredita que a informação aprofundada é um instrumento fundamental de qualificação do debate público sobre assuntos importantes não só para a classe empresarial, mas para toda a sociedade. É neste sentido que a entidade publica, bimestralmente, a Revista Problemas Brasileiros.

Inscreva-se para receber a newsletter e conteúdos relacionados

* Veja como nós tratamos os seus dados pessoais em nosso Aviso Externo de Privacidade.
Fechar (X)