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Legislação

Juristas debatem modulação da decisão do STF sobre a "coisa julgada"

Segundo especialistas, caso o Supremo defina pela retroatividade, diversos setores serão impactados pela insegurança jurídica

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Juristas debatem modulação da decisão do STF sobre a "coisa julgada"
“Todo cidadão que for lesado, tem o direito de ser ressarcido”, destacou Ives Gandra da Silva Martins sobre o tema (Arte: TUTU)

Por Filipe Lopes

A coisa julgada é uma garantia constitucional, respaldada no Artigo 5º inciso XXXVI da Constituição Federal, conforme os dizeres: “A Lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.” Contudo, as decisões proferidas pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), RE 949297 (Tema 881) e RE 955227 (Tema 885), colocam em risco a segurança jurídica no País, por permitir que uma decisão judicial seja revista pelo Supremo, possibilitando, inclusive, o Fisco a cobrar retroativamente o contribuinte sobre tributos devidos.

O Conselho de Assuntos Tributários (CAT), da Federação do Comércio de Bens, Serviço e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), trouxe, em reunião presencial na última quarta-feira (15), um debate com especialistas em matéria tributária para elencar as consequências jurídicas da decisão do STF e como os negócios poderão ser impactados.

Durante a abertura da reunião, Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do CAT, destacou que este ano começou com grandes discussões acerca do sistema tributário nacional, com a promessa do governo federal em discutir o texto da Reforma Tributária ainda no 1º semestre, a edição da Medida Provisória 1.160/2023, que determinou o retorno do voto de qualidade do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e a decisão do STF sobre flexibilização da coisa julgada. “O início de 2023 foi conturbado, com notícias que causaram e ainda causam grande insegurança aos contribuintes”, afirmou Costa, que também é presidente do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte de São Paulo (Codecon-SP).

Por unanimidade, o plenário do STF definiu, em fevereiro, que: “as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações”. Na prática, a garantia constitucional da imutabilidade das decisões transitadas em julgado não será respeitada, quando o Supremo decidir de forma divergente, em sede de ação ou recurso com efeito erga omnes (que vale para todos).

Instabilidade jurídica

A decisão proferida pelo plenário do STF, além de flexibilizar de forma ampla a coisa julgada, permitirá a cobrança retroativa de tributos (antes considerados indevidos por decisão judicial definitiva) pelos órgãos fazendários, que por sua vez, poderá inviabilizar a manutenção de inúmeras atividades econômicas, pelo volume a que esses valores podem alcançar, com impacto direto e indireto na geração de empregos e, ainda, na capacidade de investimento de muitas empresas, já tão devastadas pelos reflexos da pandemia e da instabilidade política.

Ao obterem do Poder Judiciário uma decisão favorável com trânsito em julgado, os contribuintes não “provisionam” valores para eventual mudança de entendimento jurisprudencial – afinal, “confiaram” no primado da coisa julgada (imutabilidade) ao levar suas questões aos tribunais.

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Da esquerda para a direita: Ives Gandra da Silva Martins, Fernanda Donnabela Camano, Márcio Olívio Fernandes da Costa, Fernando Facury Scaff e Walter Carlos Cardoso Henrique
(Divulgação/FecomercioSP)

Segundo Ives Gandra da Silva Martins, presidente do Conselho Superior de Direito da FecomercioSP, se os contribuintes se sentirem lesados por confiarem na Justiça, depois de terem seus direitos julgados novamente pelo STF, podem recorrer e processar o Estado. “Todo cidadão que for lesado, tem o direito de ser ressarcido”, ponderou.

Tudo em aberto

A decisão do STF liga o sinal de alerta nas empresas, porém, para Fernanda Donnabela Camano, professora de Direito na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV/SP), no Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET/SP) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), ainda é possível que sejam protocolados os embargos de declaração com pedido de modulação dos efeitos do julgamento, para garantir que o Supremo não retroceda aos processos julgados no passado.

“A mensagem que o STF passa com essa decisão é a preponderância da isonomia sob o viés econômico, além de colocar em xeque a segurança jurídica, em detrimento ao dever que todos têm de pagar tributos”, afirma a professora de Direito.

No entendimento de Fernando Facury Scaff, professor titular de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), o debate ainda vai ir longe no Supremo, mas dois fatos concretos foram traçados. “As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo”, ponderou.

Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral, segundo a interpretação de Scaff, interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas os princípios da irretroatividade e anterioridade anual ou a anterioridade nonagenal, conforme a natureza do tributo.

Outro especialista que manifestou sua oposição à decisão do STF é Walter Carlos Cardoso Henrique, professor de Direito Tributário na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), integrante do Instituto de Pesquisas Tributárias (IPT) e conselheiro do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA). Segundo ele, a postura do Supremo, pelos votos dos ministros, demonstra a gravidade das possíveis consequências para as relações entre advogados, contadores, empresários e contribuintes em geral. “Agora teremos que analisar todos os processos com base no entendimento constitucional, segundo a interpretação do Supremo. O STF quase que se equipara a um legislador positivo”, ponderou Henrique.

Ação no Congresso

O deputado federal Kim Kataguiri também participou da reunião do CAT e apresentou sua proposta a fim de alterar a legislação para vedar a retomada da cobrança de tributo com decisão transitada em julgado. Para o deputado, a postura adotada pelo STF distorce ainda mais o já caótico sistema tributário nacional, quando permite que decisões sejam revistas. “Pela complexidade do sistema tributário brasileiro, vemos casos de empresas que usam benefícios fiscais e decisões transitadas em julgado como trunfos de mercado para superar a concorrência e ter vantagens. Isso foge do parâmetro de livre mercado e da livre concorrência”, afirmou o deputado.

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