Negócios
04/12/2024Liderança organizacional vai muito além de potencializar talentos e superar entraves
Ricardo Basaglia, CEO da Michael Page, compartilha ‘insights’ sobre liderança e gestão durante último encontro do ano das diretorias da FecomercioSP e do Cecomercio
“Cerca de 91% dos profissionais contratados por habilidades técnicas, experiência na área, bons projetos e formação são demitidos por questões comportamentais, como falta de atitude, dificuldade para trabalhar em equipe ou desalinhamento com a cultura da empresa. Por isso, a gestão começa com a autogestão.” Essa reflexão de Ricardo Basaglia — CEO da companhia especializada em recrutamento Michael Page — revela um dos pilares essenciais para os empresários e gestores que aspiram a liderar com eficiência.
Em sua apresentação durante a última reunião de 2024 das diretorias plenas da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) e do Centro do Comércio do Estado de São Paulo (Cecomercio), realizada no início de dezembro, Basaglia destacou que a capacidade de alguém gerenciar a si mesmo é fundamental antes de assumir a responsabilidade de liderar equipes e organizações.
Confira, a seguir, alguns destaques da palestra realizada para mais de 150 pessoas, durante evento organizado pela FecomercioSP.
Adaptabilidade: o novo diferencial de sucesso
No cenário atual, marcado por rápidas transformações, o Quociente de Adaptabilidade (QA) se tornou mais relevante do que o Quociente Intelectual (QI) e o Quociente Emocional (QE). “Hoje, de tudo o que vem se estudando para alguém obter sucesso contínuo, é o QA que se destaca. Quanto mais adaptável você é, maior a chance de sucesso”, explicou Ricardo. Ele ressaltou que insistir em antigas fórmulas ou esperar que cenários do passado retornem ao presente é um erro comum que pode custar caro a profissionais e empresas.
Lacunas como oportunidades de melhoria
Uma das histórias mais impactantes compartilhadas pelo CEO veio da sua conversa com Carlos Britto, presidente da Ambev Global. “Brito sempre perguntava aos seus gestores: ‘Quais são as lacunas na sua área?’. Se alguém dissesse que não havia nenhuma, ele saberia que era hora de mudança na liderança. Porque se não há lacunas, não há oportunidade de melhoria. Preciso de pessoas que busquem lacunas e as reconheçam, além de traçar e executar planos, resolver os problemas e ir em busca dos próximos desafios. A melhoria é contínua. Se você não implementar esse modelo na sua empresa, cairá no famoso pacto de mediocridade.”
O pacto de mediocridade acontece quando áreas de uma empresa evitam apontar problemas ou cobrar melhorias em outras equipes para que, em contrapartida, também não sejam incomodadas. Esse comportamento pode até criar uma sensação de harmonia no curto prazo, mas, na prática, deixa a empresa estagnada e “na mediocridade”, pontuou Basaglia.
Performance equivale a talento menos interferência
Em sua apresentação, Basaglia ressaltou que não basta ter profissionais talentosos se os ambientes de trabalho estão repletos de barreiras, como conflitos interpessoais, desmotivação ou problemas estruturais. “Performance é igual a talento menos interferência. Por quê? Talento é tudo o que você tem para entregar resultados, as suas habilidades, as suas experiências, os seus recursos. Interferência é tudo o que o impede de entregar esses resultados.”
Nesse sentido, ele citou uma fórmula que permite mensurar em que ponto a empresa se “autossabota”. “Não adianta ter um talento nota 9, mas interferência nota 7. Nessa situação, alguém com menos talento, mas com muito menos interferência, entrega mais. Então, o grande papel do líder não é somente potencializar o talento das pessoas, mas, principalmente, diminuir a interferência no trabalho.”
Liderança com escuta ativa e proximidade
“Gestão não se faz atrás da mesa, mas com o cheiro do asfalto,” afirmou Basaglia, enfatizando a importância de líderes estarem próximos às operações e às equipes. “É estimado que um CEO, ‘o número 1’, conheça 5% dos problemas da empresa. Os diretores, em média, conhecem 20%; os gerentes, na média, conhecem 50%; e a base, normalmente, conhece 100%. Contudo, os mecanismos que fazem com que a informação chegue ao CEO filtram muita coisa importante. Se você não andar pela empresa, [a solução] não vai surgir.”
Ricardo Basaglia. Foto: Edilson Dias
Saúde mental e performance: o papel do líder como exemplo
O CEO advertiu que o mundo vive, atualmente, uma verdadeira epidemia de saúde mental nas empresas, e soluções superficiais como “pintar paredes de cores vibrantes, comprar pufes coloridos ou instalar escorregadores nas recepções não resolverão esse problema. A verdadeira mudança começa com as pessoas cuidando de si mesmas, e cabe aos líderes puxar os empregados pelo exemplo. Isso, para mim, está diretamente ligado à performance.”
Em outras palavras, um líder que prioriza o próprio bem-estar transmite uma mensagem clara sobre a importância desse cuidado, criando um ambiente onde os colaboradores se sintam encorajados a fazer o mesmo. Essa atitude não é apenas uma questão de empatia, mas de estratégia — profissionais com saúde mental equilibrada são mais engajados, produtivos e capazes de lidar com as adversidades do dia a dia.
O desafio de liderar com recursos limitados
Basaglia ainda frisou que liderar envolve extrair o melhor das condições disponíveis, mesmo diante de restrições de tempo, orçamento ou equipe. Reconhecer essas limitações e buscar soluções criativas e práticas são habilidades essenciais para os gestores que desejam alcançar resultados consistentes. “Na empresa, nunca temos o tempo, o dinheiro e as pessoas [na equipe] que gostaríamos. O papel do líder é extrair o melhor diante do cenário imposto, pois nunca haverá condições perfeitas”, complementou.
Por fim, para liderar no mundo atual, em busca de constante evolução, o CEO propôs uma reflexão contínua. “O orgulho do seu passado jamais deveria ser maior do que o seu interesse pelo futuro”, enfatizou. “Quanto mais experiente nos tornamos, mais crescemos, mais construímos e, infelizmente, mais perdemos o nosso poder de escuta. E esse talvez seja um dos grandes desafios do gestor”, concluiu.
Ivo Dall’Acqua Júnior. Foto: Edilson Dias
Em seu discurso no evento, o presidente em exercício da FecomercioSP, Ivo Dall’Acqua Júnior, salientou o talento das pessoas e da liderança organizacional, reiterando que a transformação é a essência do progresso da sociedade e das empresas. “Não há evolução sem transformação. Afirmo com serenidade que acompanhamos o espírito do tempo, não nos acomodamos — e jamais poderemos nos acomodar. O mundo está mudando rápido, e temos formas de acompanhar e ditar os rumos dessas transformações. Afinal, formamos uma rede sólida, capaz de sensibilizar a sociedade para um Brasil mais eficiente, produtivo e moderno”, disse Dall’Acqua Júnior.