Sustentabilidade
17/06/2015Para reciclagem avançar no país, falta coleta seletiva mais eficiente
Especialistas apontam ainda que a população deve separar os materiais e o governo fiscalizar e oferecer estrutura adequadas
Por Jamille Niero
O Brasil tem um bom desempenho na reciclagem de materiais como o alumínio – que chega a registrar índice de 97% de reciclagem de latinhas -, o papel e o plástico. No caso das latinhas, o alto índice de reciclagem é devido ao atrativo valor do alumínio, o que incentiva a coleta. Contudo, ainda há muito material a ser reciclado e outros fatores precisam evoluir para aumentar esse volume.
Na análise do professor do curso de Gestão Ambiental da Universidade de São Paulo, Ednilson Viana, para aumentar a quantidade de materiais encaminhados para a reciclagem é necessário programas de coleta seletiva mais abrangentes e eficientes. “O atual modelo de coleta seletiva nos municípios brasileiros tem como apoio básico os catadores, mas não dá para depender apenas deles para segregar o material gerado em grandes cidades, tem que implantar sistemas mecanizados”, diz.
Segundo o professor, dados do Cempre (Compromisso Empresarial para a Reciclagem) apontam que apenas 17% dos municípios brasileiros têm programas de coleta seletiva. E nem sempre ter um programa significa eficiência, já que muitas vezes os programas existentes não atendem todos os bairros de um município ou fazem a coleta em uma quantidade de dias suficiente.
“O poder público precisaria disponibilizar uma estrutura adequada, com coleta eficiente e pontos de entrega voluntária, com informações sobre o funcionamento do programa para a população”, complementa Viana.
Com o objetivo de estimular a reciclagem e o correto descarte dos resíduos sólidos, a Política Nacional de Resíduos Sólidos atrelou o repasse de verbas aos municípios à entrega dos planos de gerenciamento de resíduos sólidos. O problema é que o prazo venceu em agosto de 2014 e muitos municípios não entregaram seus planos. Além disso, após o desenvolvimento do plano vem a etapa de implantação – que nem sempre é cumprida.
A participação da população na correta separação dos resíduos – o que pode ser reciclado do que não pode – também é importante: é o primeiro passo para a reciclagem. O professor e pesquisador do Laboratório de Corrosão, Proteção e Reciclagem de Materiais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (LACOR-FRGS), Alvaro Meneguzzi, destaca que o consumidor também é responsável pelo descarte ambientalmente correto dos resíduos sólidos, sejam eles reciclados ou enviados para aterros sanitários.
Essa responsabilidade é compartilhada entre produtores, comerciantes e consumidores, conforme determina a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), em vigor desde 2010. “O que falta é instalar uma cadeia de logística reversa que funcione. A PNRS diz que o produtor e o consumidor são responsáveis pela logística reversa. Mas todos tentam se livrar disso”, aponta Meneguzzi.
Ele relata algumas medidas eficazes adotadas por outros países ao incluírem o consumidor na logística reversa – que é dar a destinação adequada ao produto comprado após o uso. “As pessoas elogiam a Alemanha, que devolve dinheiro para o consumidor quando este devolve uma garrafa após o uso. O que não falam é que o valor do vasilhame está embutido no preço pago pelo consumidor alemão ao comprar a bebida. No Japão, quando as pessoas compram uma geladeira nova, pagam uma taxa para uma empresa ir recolher a geladeira antiga e dar a destinação adequada, como a retirada dos gases que prejudicam a camada de ozônio”, exemplifica. O professor observa que, apesar de o Brasil não estar preparado para algo desse tipo, é preciso um passo inicial.
Os dois especialistas concordam que o papel do governo é organizar essa cadeia e fiscalizar os processos. Deve também conscientizar a população a evitar ao máximo a produção de resíduos, reutilizando os materiais que puder e encaminhando o que não tiver mais uso para a reciclagem.
Tipos de reciclagem
Há três tipos de reciclagem: a mecânica, a energética e a química. A mais comum no Brasil é a mecânica, que usa o material usado e processado para produzir outro item igual – ou seja, uma latinha de alumínio pode ser usada para produzir uma nova. Já a mais usada no mundo, de acordo com o professor da UFRGS, é a energética – que produz energia a partir da incineração de resíduos sólidos.
Um levantamento do Ministério das Cidades, com dados de 2012, aponta que por volta de 94% dos resíduos sólidos produzidos nos municípios brasileiros vão para aterros. De acordo com a PNRS, que prega a valorização dos resíduos sólidos, esta seria a terceira etapa na hierarquia da disposição dos resíduos descartados.
A primeira etapa, explica o professor da USP, seria a reutilização ou reciclagem dos materiais por meio de processo mecânico. Se não for possível, encaminhar os resíduos para a segunda etapa, que é a queima para produção de energia. Em último caso, enviar os resíduos para aterro sanitário.
“Ao manter um modelo de gestão de resíduos urbanos que preza pelo aterramento, estamos desperdiçando matéria prima”, lamenta Viana.
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