Editorial
14/09/2021PIB do primeiro semestre foi bom, mas já é “retrovisor”
Artigo explica por que o aumento do PIB vem perdendo força no Brasil
As perspectivas apontam para um semestre mais duro e um 2022 cheio de desafios
(Arte: TUTU)
*Por André Sacconato
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro do segundo trimestre, que se mostrou praticamente estável, com variação negativa de 0,1%. No semestre, o crescimento foi de 6,4%, resultado que frustra expectativas e mostra um cenário preocupante: a economia nacional vem perdendo força e tração. Entretanto, a abertura destes dados pode nos dar uma visão melhor de como as tendências são heterogêneas entre os setores econômicos.
Pelo lado da oferta, tivemos uma contribuição negativa surpreendente. A despeito de o setor agropecuário ter sofrido queda de 2,8%, há uma explicação que pode nos dar esperanças para as próximas divulgações, uma vez que a sazonalidade bienal do café contribuiu muito para este resultado. O preocupante, agora, é não saber até que ponto a falta de água pode ser negativa para as próximas safras.
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A indústria também registrou contribuição negativa de 0,2%, causada pela falta de equipamentos – principalmente no setor automobilístico –, pela escassez de chips e pela inflação ao produtor, em razão das commodities, do câmbio e da crise hídrica. O único dos setores que obteve contribuição positiva foram os serviços, com alta de 0,7%, já sentindo os efeitos do avanço da vacinação.
Pelo lado da demanda, o consumo das famílias se manteve estável, com aumento nos gastos do governo (0,7%) e queda expressiva na Formação Bruta de Capital Fixo (FBKF) (-3,6%). Este resultado negativo é preocupante porque denota queima de estoques formados em excesso no primeiro trimestre. A variável mostra que, com o crescimento econômico do primeiro trimestre, houve, talvez, um excesso de otimismo, turbinando os estoques. Assim, com estes últimos cheios, os empresários acabaram enfrentando frustrações pelo caminho.
No mesmo período, o IBGE também divulgou o resultado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). O desemprego recua, mas continua muito alto. O indicador fechou o semestre em 14,1%, contra 14,7% no primeiro trimestre. Ainda assim, este número representa 14,4 milhões de indivíduos buscando recolocação no mercado de trabalho. A diminuição na taxa se deve ao aumento do número de pessoas empregadas.
Além disso, outro dado importante: a quantidade de subocupados – trabalhadores empregados em menos horas do que poderiam ou gostariam – atingiu o recorde de 7,5 milhões. No segundo trimestre do ano anterior, este número representava 5,6 milhões – e isso significa alta de 4,4%. O número de pessoas subutilizadas (desocupadas e subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas) foi de 32,2 milhões. Estas informações expõem um limite de crescimento, pois a capacidade de consumo continua reprimida.
A divulgação da produção industrial de julho, dado já do terceiro trimestre, também é preocupante. Apesar do crescimento em 12 meses e no acumulado do ano (respectivamente, 11% e 7%), a queda de 1,3% em relação a junho reforça a tendência de desaceleração.
Em um momento no qual a variante delta entrava a recuperação tanto nos Estados Unidos como na China, que já apontam dados mais modestos, o mercado de trabalho fraco e a inflação, somados à incerteza fiscal, podem arrefecer significativamente o crescimento da economia de 2021 e 2022.
O resultado bom no início do ano já é “retrovisor”. As perspectivas apontam para um semestre mais duro e um 2022 cheio de desafios. É importante fazer a nossa parte, com um ajuste estrutural mais ousado, pouca instabilidade e transição de poder tranquila, seja quem for o novo presidente da República.
Saiba mais sobre o Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP).
*André Sacconato é economista, consultor da FecomercioSP e integrante do CEEP.
Artigo originalmente publicado no Portal Contábeis em 10 de setembro de 2021.