Notamos que você possui
um ad-blocker ativo!

Para acessar todo o conteúdo dessa página (imagens, infográficos, tabelas), por favor, sugerimos que desabilite o recurso.

Negócios

Rua São Caetano reúne todo tipo de produto e serviço para casamentos

A indústria de casamentos cresceu 8% em 2014, na comparação com o ano anterior, movimentando R$ 15 bilhões

Ajustar texto A+A-

Rua São Caetano reúne todo tipo de produto e serviço para casamentos

Por Rachel Cardoso

Uma visita à Rua São Caetano é praticamente obrigatória a todas as noivas que se preparam para o grande dia. Não à toa, elas são capazes de passar mais de um ano em busca do modelo perfeito. Afinal, o vestido carrega todo um simbolismo e significa, para muitas, a concretização do sonho de uma vida: o casamento.

Para entender essa experiência o mais próximo da realidade, fui à Rua São Caetano viver um dia de noiva. Lá, pude compreender um pouco mais os anseios dessa consumidora, capaz de desembolsar, por baixo, valor equivalente a um carro zero quilômetro para realizar uma cerimônia sem muito luxo. Com glamour, o desembolso vai para a casa dos três dígitos.

A rua começa na Pinacoteca do Estado de São Paulo, um dos mais importantes museus de arte do Brasil, na Avenida Tiradentes. Foi ali, num edifício no Jardim da Luz, centro de São Paulo, que comecei esta reportagem, em uma segunda-feira.

Durante a semana, o local é bem diferente do burburinho do sábado, quando bandas se instalam nas calçadas para mostrar os dons musicais aos futuros noivos na expectativa de um contrato para animar a festa. “É um vaivém que dá gosto de ver”, diz Juvenil dos Santos, vendedor de Zona Azul e velho conhecido na vizinhança, que me deu boas dicas no dia em que virei noiva.

O sábado, porém, não é bom para os negócios, pois o público é basicamente de curiosos. Tradicionalmente, as compras são fechadas durante a semana. Por isso, os comerciantes reservam de quarta a sexta para a prova final, quando são feitos os últimos ajustes antes da entrega da peça. Na segunda e na terça-feiras predominam as vendas por atacado, mas é possível encontrar noivas extasiadas em busca de acessórios, locação de carro e até presentes para os padrinhos, algo que eu, na condição de noiva de primeira viagem, nem sabia que existia. São mimos oferecidos ao casal quando é feito o convite para que ele testemunhe o grande dia.

A organização de uma cerimônia, com tanto protocolo, pode deixar uma noiva à beira de um ataque de nervos. “É muita coisa para decidir e fica difícil até manter a boa aparência”, diz Cleide de Souza, de 29 anos, que sobe ao altar neste mês de maio, tradicionalmente conhecido como mês das noivas.

Ela levou um ano e meio para escolher o vestido, mas não se deixou fotografar. Além da superstição (dá azar), Cleide alegou estar “muito desarrumada”. Eu a encontrei na loja Laços de Ternura, em busca de uma tiara deixada para “a última hora”.

No celular, ela mostrava uma foto enviada por uma conhecida, também noiva, que servia como referência para o modelo que ela procurava. A ida à Rua São Caetano foi durante o horário de almoço. “Uma correria sem fim”, resume. E isso porque o casório terá apenas uma cerimônia para os mais chegados. A festa foi no noivado.

Dá para entender parte dessa afobação. As dúvidas florescem a cada escolha de acessório. Até por isso, as vendedoras da São Caetano se desdobram em várias tarefas. É pré-requisito, por exemplo, saber o básico de penteados, porque as noivas precisam se ver o mais próximo possível de como ficarão. Na linha da experimentação, há testes para tudo: sapato, maquiagem, doces, bebidas e afins.

Em algumas lojas, as vendedoras agem como consultoras de fato, sugerindo, inclusive, evitar os exageros, mas nem sempre a dica é respeitada. Há gosto e bolso para todo tipo de extravagância.

Na saga pelo vestido branco e pelo véu perfeitos me identifiquei, inicialmente, como noiva que subiria ao altar em três meses. O prazo causou estranhamento entre as vendedoras, acostumadas a trabalhar com anos de antecedência. “Meu Deus, está em cima da hora”, exclamou a primeira, levando a mão à boca com cara de espantada. Para justificar a presença da fotógrafa, inventei que a profissional estava ali para fazer o making off do meu casamento. A vendedora da Center Noivas & Debutantes achou “um luxo” ter o registro visual de todas as etapas, desde a escolha do vestido, mas foi logo avisando que não poderíamos fotografar.

A explicação está nas redes sociais: a divulgação das imagens funciona como uma armadilha em um negócio em que a concorrência e a margem de lucro são apertadas. Registro de imagens só depois de fechar a compra, o que evita cópia do modelo escolhido.

A regra levou por água abaixo minha missão de passar um dia na São Caetano como aspirante à noiva, sem revelar a verdadeira identidade de repórter. Cartazes nas vitrines de diversas lojas, alertando sobre a proibição de fotos, obrigaram-me a reconsiderar a ideia de reviver o filme O casamento Muriel, sucesso cinematográfico de 1994, na qual a protagonista experimenta diversos vestidos de noiva ao som da trilha sonora do Abba.

Decidi me apresentar como repórter e funcionou. Foi na Mirna Noiva, com o atendimento da estilista Cristiane Ferraz, que a minha transformação começou. Não é missão fácil. A primeira tarefa é definir o orçamento para a ocasião. Os preços dos vestidos variam de acordo com a escolha da noiva: primeira locação, segunda locação ou compra. “Usualmente elas preferem primeira locação, mas vem muita gente de fora do Estado para comprar”, observa Cristiane.

Com mais de 30 anos de experiência no ramo, ela dá uma boa olhada no meu perfil e, com cinco minutos de conversa, escolhe o meu vestido de princesa. Nesta hora, ela não analisa só o manequim das pretendentes, mas também a condição financeira, o tipo de cerimônia e o horário escolhido. “Você lida com a emoção das pessoas. É preciso ter tato”, diz.

Enquanto arruma meu cabelo, ela recorda o pedido mais inusitado que já recebeu. Um vestido vermelho, estilo medieval, com calda de cinco metros para uma cerimônia em um castelo. “Era uma peça bastante sensual”. Ao contrário da minha, cuja sugestão recaiu sobre algo mais romântico: um tomara que caia com saia rodada, como o leitor pode conferir na foto ao lado. E não é que caiu como uma luva. Aprovei.

Após provar o vestido as coisas se complicam um pouco. É preciso definir brincos, colar, sapato, véu e buquê. O conjunto precisa ser harmonioso e tudo, claro, é cobrado à parte.

Escolhi uma tiara, mas Cristiane me fez mudar de ideia. Sugeriu outra, mais romântica, que combinava com o vestido e com as pérolas nas orelhas. O vestido custa R$ 4,5 mil para compra e R$ 2,5 mil para alugar. Na conta entram ainda R$ 200 dos brincos; R$ 380 do véu e outros R$ 380 da tiara. O buquê pode variar de R$ 600 a R$ 1,8 mil. Ou seja, mesmo com a locação, o meu modelo não sairia por menos de R$ 4 mil, sem considerar o custo do sapato.

Não vou negar a emoção que foi me ver vestida de noiva, ainda que o figurino não seja exatamente confortável. Entendi porque muitas mulheres investem as economias de uma vida inteira por um dia de princesa.

Mas nem só de noivas é feita a história da Rua São Caetano. Como coadjuvantes, figuram pessoas como a “minha” estilista Cristiane e como Benedita Marlene dos Santos. Vaidosa ela não revela a idade, mas diz que passou de lojista à funcionária no decorrer dos mais de 30 anos no comércio local. Dona de uma loja de vestidos de noiva na década de 1990, ela abandonou tudo para ir atrás de um grande amor. “Perdi o comércio e o marido”, conta, sem perder a animação.

O lojista João Stéfano está na rua há 57 anos. Ele faz coro à Benedita e à Cristiane nas queixas ao movimento roubado pela expansão de lojas de bairro. “Antigamente, o público tinha pouca opção, mas hoje o cenário é outro”.

O cenário por ali, aliás, é tão diversificado quanto as vitrines, nas quais se misturam vestidos coloridos, gatos sonolentos e cartões de visita. A esta miscelânea somam-se ainda lojas especializadas na venda de máquinas de costura industrial e manequins para vitrine. Na Fibrasil a diversidade de modelos chama atenção. São bonecos gigantes, brancos, negros, magros, gordos.

Abençoados por São Caetano (patrono do pão e do trabalho), espalham-se dezenas de outros estabelecimentos, como lojas de molduras, uma casa agropecuária, vendedores ambulantes e botequins que servem Virado à Paulista por R$ 20. Foi em um deles que eu a fotógrafa encerramos esta reportagem. Deixei de lado a pose de princesa e voltei à realidade com gosto de couve e tutu de feijão.

Juntando as alianças

A indústria de casamentos cresceu 8% em 2014, na comparação com o ano anterior, movimentando R$ 15 bilhões, segundo a Associação dos Profissionais, Serviços para Casamento e Eventos Sociais (Abrafesta). A entidade registra que os gastos com festas e cerimônias são ascendentes: aumentam, em média, 10% ao ano. A corrida para o altar deve continuar em alta: há 34 milhões de solteiros no Brasil entre 20 e 40 anos. Cerca de 40% deles – 14 milhões de pessoas – querem casar nos próximos dois anos, segundo levantamento do IBGE. Se apenas a metade concretizar o desejo, o resultado será algo próximo a R$ 40 milhões movimentados, em média, por dia. A organização de um enlace matrimonial reúne entre 38 a 42 serviços diferentes, o que dá uma ideia do potencial de negócios do setor. Afinal, organizar um casamento pode ser quase tão complexo quanto encontrar o par ideal.

Clique aqui e confira a reportagem completa, publicada na edição de nº 38 da revista C&S.

Fechar (X)