Editorial
29/11/2023Só a moderação e a liberalização podem salvar a Argentina
Pobreza atinge quase metade da população e inflação alcança altos níveis, diz especialista
Por André Sacconato*
Costumo dizer que a Argentina é o país que mostra a importância da ciência econômica. Em 1900, o país era simplesmente o mais rico do mundo, ou pelo menos estava entre os seis mais ricos, dada as polêmicas com os dados da época. A ponto de os franceses cunharam a famosa expressão “rico como os argentinos”.
Hoje, o país carrega em seus dados uma pobreza de quase metade da população e uma inflação que passa em muito os três dígitos. Sinais de políticas econômicas populistas e mal-empregadas e de uma época marcada pela ascensão e sucesso do peronismo, um misto de república sindical e populista, que levou o país à derrocada. Isso não quer dizer que não houve tentativas de tirar o país desse caminho, mas geralmente curtas e equivocadas, que só aprofundaram o abismo em que ele se meteu.
Para se ter uma ideia, a InfoMoney, em um artigo do Felipe Hermes, mostrou que o argentino médio, no início do século, era 29% mais rico que um francês, 14% mais rico que um alemão, 3 vezes mais rico que um japonês e 5 vezes mais rico que um brasileiro. Hoje o país ocupa o modesto sexagésimo sexto lugar entre os produtos internos brutos mundiais e uma tendência inevitável de piora.
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Mas como a Argentina conseguiu esse paradoxo: de uma das mais ricas nações a derrocada? Como todos os países, ela sofreu demais a crise internacional de 1929, mas respondeu de uma forma abrupta com um golpe de Estados em 1930. O ambiente ditatorial deu as condições necessárias para a ascensão ao poder, em 1946 de Juan Carlos Perón e o advento do peronismo. Foi a partir daí que a derrocada argentina tomou forma.
O peronismo aumentou em 50% o percentual dos gastos públicos em um momento em que a segunda guerra mundial corroía os pagamentos dos países desenvolvidos aos produtos agrários argentinos. Perón colocou em prática o receituário desenvolvimentista, que anos depois viria também a derrubar a economia brasileira: subsídios às empresas nacionais, industrialização forçada e aumentos expressivos de gastos públicos. Além disso, outorgou aumentos de salários que passavam, em muito, o crescimento da economia, com salários subindo mais de cinco vezes o crescimento do PIB.
Além da política populista e desenvolvimentista, o ambiente institucional foi se deteriorando: foram 6 golpes de Estado e 6 calotes no Fundo Monetário Internacional, levando embora, de vez, a confiabilidade na economia daquele país.
Mesmo algumas privatizações feitas por um governo mais liberal de Mauricio Macri, um interregno nos governos desenvolvimentistas, foram canceladas pela volta do peronismo, dificultando futuras vendas das estatais. Quem pode garantir que não haverá a volta dos populistas e a retomada das empresas pelo Estado? Quem investe num cenário destes?
A vitória do liberal Milei traz à tona uma questão: o quanto radical ele será? Discussões como o final do Banco Central ou cortar relações com a China só farão mal ao povo e a nação argentina e trará de novo o populismo em quatro anos.
Está posta a mesa a chance de dar um choque de produtividade na economia argentina, que ainda apresenta dados muito positivos educacionais e sociais. Isso vai demandar posições mais ponderadas e centralizadas do novo presidente.
É importante mostrar como o Peronismo foi uma catástrofe a mudança de padrão de crescimento exigirá composição com várias correntes liberais, inclusive fora da Argentina. Está nas mãos de Milei essa possibilidade. Se ele for moderado a nação vizinha poderá ter anos prósperos. Caso não seja, o pêndulo radical deve manter a nação vizinha num ciclo vicioso. A decisão cabe ao novo governo.
*André Sacconato é economista, consultor da FecomercioSP e integrante do CEEP.
Artigo originalmente publicado no Portal Contábeis em 24 de novembro de 2023.
Saiba mais sobre o Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP).