Negócios
30/07/2024Voa Brasil não oferece mais do que um buscador de passagens
Programa frustra expectativas por não envolver o ‘trade’ do Turismo; foco do governo deveria ser a correção dos entraves que encarecem o preço
No último dia 24, o governo federal, enfim, lançou o programa Voa Brasil, com o potencial de incluir, em uma primeira etapa, 23 milhões de aposentados do INSS no transporte aéreo brasileiro. Aqueles que não tenham viajado nos últimos 12 meses poderão ter acesso a passagens de até R$ 200 em cada trecho, excluindo as taxas de embarque. O lançamento ocorreu por meio do Ministério de Portos e Aeroportos.
Ao que tudo indica, a plataforma mostrará as disponibilidades de assentos dentro desse valor e que já sejam comercializadas. Em outras palavras, não se trata de um benefício financeiro para os aposentados, mas de um canal de busca específico que indicará, de forma mais objetiva, os trechos de até R$ 200 — e sem qualquer subsídio do governo ou promoção especial das companhias aéreas.
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) avalia que a democratização no setor aéreo é muito importante. Entretanto, o programa ainda aponta falhas e não deve ter os objetivos atingidos na proporção desejada. Por isso, há diversos pontos críticos a serem corrigidos para que o Voa Brasil seja mais eficaz. Confira, a seguir, quais são.
Baixa educação tecnológica: o público mais velho e de baixa renda, que não tenha viajado de avião nos últimos 12 meses, é o critério de limite do programa. O governo fala em 95% da população que ganha até dois salários mínimos. Geralmente, esse perfil tem baixa educação tecnológica e pode ter muita dificuldade no acesso às informações necessárias sobre aeroportos de origem e destino, escalas e conexões, perfis tarifários, bagagens, horários dos voos, formas de pagamento etc.
Sobre o acesso na plataforma Gov.br, a FecomercioSP mantém o mesmo argumento sobre o início de outro programa, o Desenrola: a necessidade de ter, no mínimo, o perfil prata pode dificultar a adesão.
Agência de viagem: um grande equívoco foi o não envolvimento das agências de viagem, que seriam fundamentais para “traduzir” as informações aos possíveis beneficiários, oferecendo, inclusive, serviços adicionais a fim de que possam viajar de forma adequada ao planejado e com a devida segurança. A maior parte do público de lazer no Brasil faz compras por meio das agências de viagens e operadoras, sobretudo dentro do perfil sênior.
Limitação de rotas longas: normalmente, as tarifas de até R$ 200 são de rotas mais curtas — e há uma dificuldade enorme em torno da busca por passagens a esse preço em condições normais. Ainda que as companhias lancem mão de promoções, de forma a possibilitar melhores preços, quando se tem em vista a dimensão do território brasileiro — e de aposentados com familiares em outras regiões e que gostariam de visitá-los —, não é esperado que haja um número elevado de passagens, por exemplo, de São Paulo para Fortaleza ou Recife, ou de Manaus a Salvador por R$ 200.
Acompanhantes: ao que tudo indica, os acompanhantes que não se encaixam nas condições do Voa Brasil não poderão usufruir do programa. Como não se trata de uma promoção, não está claro se será possível, dentro da plataforma, comprar passagens para mais pessoas ou se a compra terá de ser feita no site da companhia aérea, com reservas diferentes. É de se imaginar que esse perfil, de aposentados, tenha maior propensão a viajar com alguém.
“Mesmo após um ano e meio de discussões, o governo não conseguiu elaborar um programa competente que ofereça passagens baratas. Há outros avanços essenciais para que o custo da aviação reduza e possibilite preços mais acessíveis ao consumidor, sem a necessidade de um programa específico, como reduções da carga tributária, da judicialização e dos juros, além de melhorias na infraestrutura aeroportuária, entre outros. Do que foi mostrado até agora, trata-se de mais uma expectativa frustrada. Por fim, o governo não precisa elaborar um buscador, de modo que uma conversa ampla com o trade do setor traria soluções mais eficientes. Com isso, o Voa Brasil poderia, de fato, decolar”, pondera Guilherme Dietze, presidente do Conselho de Turismo da FecomercioSP.