Economia
04/08/2017“À medida que se universalizou o acesso à educação, prestamos pouca atenção em qualidade”, observa Eduardo Mufarej
Em entrevista ao UM BRASIL, CEO da Somos Educação fala sobre capacitação de professores e escolas públicas e privadas brasileiras
“Falta uma narrativa que afirme que a carreira de professor tem muitos anos de estrada pela frente”, diz Mufarej
(Foto/TUTU)
Se não ajudarmos a formar pessoas com espírito crítico e raciocínio lógico mínimo, teremos problemas de produtividade e eficiência no mercado de trabalho, adversidades que o Brasil já enfrenta como reflexo de uma educação básica precária, observa Eduardo Mufarej, CEO da Somos Educação, maior empresa de educação básica do País, em entrevista ao UM BRASIL. Em conversa com a jornalista Érica Fraga, o empresário aborda as deficiências na formação de professores e no modelo educativo predominante hoje, bem como as reformas da base curricular e do ensino médio e o papel da tecnologia no aprendizado.
“O Brasil fez uma escolha pelo acesso: hoje, a população brasileira em idade escolar tem acesso a vagas em sala de aula e estrutura mínima. Por outro lado, à medida que se universalizou o acesso à educação, prestamos pouca atenção em qualidade”, observa Mufarej. “A exclusão começa no momento que você não aprende português, matemática, você está fadado a ter limitações severas ao longo de toda sua vida. Esse senso de urgência é primordial para que possamos constituir gerações distintas a partir de agora”, afirma.
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Segundo ele, atualmente, existem condições para que o Brasil consiga fazer essas mudanças. “Não temos mais o bônus demográfico, a retórica de que o Brasil é um País jovem já não se aplica, as salas de aula e os professores já estão dados”, explica, enfatizando que agregar qualidade ao ensino é o principal desafio. “Trazer indicadores, avaliações e, mais importante, agir de forma efetiva em cima dessas lacunas que precisam ser trabalhadas desde a primeira infância”, justifica Mufarej.
Sobre a formação de professores, ele enxerga dois agravantes que impedem a melhor atuação dos docentes. Em primeiro lugar está sua formação inicial, que não os prepara para entender as salas de aula como são hoje e suas demandas. “A licenciatura precisa se renovar, revisar suas práticas se ancorando na experiência do aluno”, afirma. “As teorias de educação são importantes, mas não são essenciais para o que a sala de aula de hoje demanda”.
O segundo agravante seria a atratividade da carreira do professor. “Esse é um quadro que temos a obrigação de mudar. Trazer gente capaz, competente, para cursos de licenciatura é fundamental se queremos ajudar a produzir resultados diferentes”, diz o empresário. Ele concorda que os professores poderiam ganhar mais, mas observa, por outro lado, a lacuna na valorização desse papel por parte da sociedade. “Falta uma narrativa que afirme que a carreira de professor tem muitos anos de estrada pela frente”.
Durante a entrevista, Mufarej ainda explica que, nos últimos 15 anos, o Brasil passou por um ciclo de investimento elevado na educação superior em detrimento da educação básica. “As pessoas que têm recursos e estudaram em escolas privadas acabam indo para a universidade pública e vice-versa. É uma equação que não faz sentido”. Segundo ele, há três anos, houve reorientação de recursos para a educação básica, o que é algo muito positivo. “Não adianta apenas continuar concedendo bolsas de ensino superior para alunos que já vêm com deficiências brutais do ensino básico, temos que garantir que os alunos que estão no ensino básico não tenham essas deficiências”.
Para o entrevistado, uma série de movimentos está acontecendo para gerar essa melhoria, como a reforma do ensino médio, a base nacional curricular e os programas de formação de professores.
Acerca do tema, ele afirma que não há uma fórmula comum capaz de solucionar todas as questões. “O Brasil tem o problema de carga horária limitada com excesso de disciplinas”, diz. A reforma do ensino médio, que propõe a possibilidade de escolher uma área de interesse durante essa etapa dos estudos, é vista como positiva pelo empresário. “Não faz sentido obrigar os alunos a consumirem 13 disciplinas com o mesmo tipo de carga horária. Uma carga horária fixa atende a média, mas no final do dia não está atendendo ninguém. Vocacionar o aluno é fundamental”.
Para ele, esse será um desafio para toda a educação brasileira, seja ela pública ou privada, pois pressupõe planos de aula e divisão de salas diferentes, entre outros. “É um desafio para nós, que operamos trinta escolas de ensino básico no Brasil, mas é um desafio na direção certa, apesar de complexo.”
Sobre o uso da tecnologia da educação, ele defende que o professor tem um papel importante, principalmente de curadoria de conteúdo, pois sabe-se que os alunos aprendem em ritmos próprios, com tecnologias diferentes e por meio de processos distintos. “A escola vai desenvolver cada vez mais um olhar para isso, que a aptidão de um aluno é muito intrínseca a ele e não algo que você aplica de forma generalizada”.
“O que vejo com clareza é que o modelo de sala de aula expositivo que prevalece hoje no Brasil provavelmente vai passar por um processo de transformação acelerado”, diz. “Existe uma visão que a tecnologia pode estar polarizando com a educação tradicional, mas na verdade não é isso, as duas deveriam ser convergentes”, conclui.
Confira abaixo a entrevista completa:
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