Legislação
17/05/2024Transação tributária é o caminho para um futuro sem litígio
Receita Federal apresenta ao Conselho de Assuntos Tributários a nova postura orientativa para as ações do órgão neste biênio
A imagem do Fisco perante o contribuinte até o século XX era aquela que ficou imortalizada pelo comercial de televisão da Receita Federal que mostrava um contribuinte tentando domar o leão, em alusão à declaração do IRPF, na década de 1980. Fato é que a postura da Receita era agir de forma coercitiva e punitiva, sem nenhum diálogo. Essa conduta vem mudando ao longo dos anos e ganhando espaço, tanto na esfera federal, como nos âmbitos estadual e municipal, para diminuir o litígio fiscal no Brasil.
A nova filosofia do Fisco foi apresentada por Cláudio Ferrer de Souza, Superintendente-Adjunto e Substituto da Receita Federal de São Paulo, durante a reunião do Conselho de Assuntos Tributários (CAT) da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), ocorrida em sua sede na última quarta-feira (15).
O cenário atual mostra que o Judiciário está à beira de um colapso pelo enorme volume de processos. De acordo com o Relatório Justiça em Números 2023, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), existiam mais de 27 milhões de execuções fiscais em 2022 dentro de um universo de endividamento de cerca de R$ 80 milhões. As execuções fiscais alcançam a taxa de congestionamento no Poder Judiciário de 88%, ou seja, somente 12 processos a cada 100 eram baixados por ano.
Diante deste grande desafio, a Receita Federal elaborou uma nova estratégia de ação, que se distancia da antiga postura punitiva do órgão, visando ao diálogo e à bonificação dos bons-pagadores.
“A lógica agora é facilitar a conformidade, inclusive oferecendo incentivos positivos para a maior parte da sociedade e negativos, principalmente, para aqueles que optam por descumprir a legislação tributária”, afirmou Souza.
Um exemplo disso é o programa Litígio Zero, que permite ao contribuinte negociar débitos em até 120 vezes com descontos de até 100% em juros e multas. A adesão ao programa vai até 31 de julho.
Ações concretas
Para mudar o cenário da litigiosidade no País, a Receita aposta também em ações efetivas que buscam a orientação em detrimento à punição. Segundo Souza, a nova filosofia do órgão é baseada em quatro medidas fundamentais:
- Estruturantes: iniciativas que visam aperfeiçoar as áreas de fiscalização, a forma como interagem com a sociedade e os sistemas utilizados;
- Facilitação: auxiliam o cumprimento das obrigações tributárias antes da entrega das declarações ou das escriturações;
- Assistência: orientar os contribuintes para a autorregulação relativa a pendências tributárias identificadas;
- Controle coercitivo: abrangem as fiscalizações, que são implementadas nos casos de descumprimento deliberado das obrigações tributárias, a exemplo das fraudes, e nos casos em que os contribuintes permanecem irregulares após a oportunidade de autorregulação.
“A transação é a ferramenta mais poderosa para regularizarmos o passado e prepararmos o futuro da relação entre o Fisco e o contribuinte, em um futuro sem litígio”, ponderou o auditor, parafraseando o secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, em seu discurso de apresentação do programa Litígio Zero, em março.
Ainda durante a reunião, Souza compartilhou o Relatório Anual de Fiscalização 2023-2024 da Receita Federal, que pode ser baixado aqui.
A reunião contou com a participação de André Felix, conselheiro e presidente da Comissão de Direito Tributário e Constitucional da OAB-Pinheiros, que apresentou suas ponderações sobre o programa, sugerindo alguns aprimoramentos sob o aspecto prático.
A harmonização da relação entre o Fisco e o contribuinte, prevalecendo o diálogo e a autorregulação, sempre foi um pleito da FecomercioSP e objeto de diversas ações junto ao Poder Público ao longo das últimas décadas. Para Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do Conselho de Assuntos Tributários, a nova postura da Receita Federal é bem-vista pelos contribuintes, mas precisa ser acompanhada de ações concretas para refletirem um novo momento para a relação. “É preciso mantermos o diálogo aberto para garantir que essa relação continue evoluindo, levando em consideração a realidade dos contribuintes e a necessidade arrecadatória do Fisco. Apostar na autorregulação é garantir que todos ganham: o contribuinte que não será punido antes mesmo de corrigir possíveis erros; e o Fisco que irá diminuir o litígio fiscal e, consequentemente, garantir a sua arrecadação”, afirmou Costa.
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