Economia
12/02/2025Trump governa blindado de críticas, e não recebe explicações sobre política tarifária, diz sociólogo
Para Thiago de Aragão, da Arko Advice, presidente dos EUA construiu imagem de “negociador implacável” em meio a mundo regulado
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A força eleitoral que alçou o presidente Donald Trump novamente à Casa Branca, nos Estados Unidos, teve como efeito colocá-lo em um "ambiente protegido de críticas", onde a equipe do governo está mais dedicada em "corrigir os erros que serão cometidos do que propriamente evitá-los", segundo análise do sociólogo Thiago de Aragão, diretor de estratégia da consultoria política Arko Advice.
Baseado em Washington, capital do país norte-americano, Aragão contou que essa não é apenas uma percepção, mas um conjunto de relatos que ele colheu entre alguns assessores próximos do próprio mandatário.
"Trump vive hoje protegido de críticas. Mesmo questões básicas, como o impacto da aplicação de tarifas sobre produtos de outros países na inflação nos EUA, não são discutidas, e tampouco o presidente recebe explicações sobre esses impactos negativos", disse ele durante a primeira reunião do Conselho Superior de Economia, Sociologia e Política (CSESP), da FecomercioSP, nesta segunda (10).
Nos últimos dias, Trump prometeu impor tarifas de 25% às exportações de aço e alumínio aos Estados Unidos, embora ainda não haja um anúncio oficial da medida. Se for adotada, será a primeira mudança protecionista do novo governo norte-americano a afetar o Brasil — segundo maior fornecedor de aço para o país, com 4,1 milhões de toneladas exportadas em 2024, segundo dados do Departamento de Comércio dos EUA.
Na visão de Thiago de Aragão, o presidente norte-americano consegue impor as medidas, mesmo que prejudiciais ao país, não apenas pelo excesso de proteção da equipe que lhe rodeia, mas também porque ele conseguiu criar uma imagem de "negociador implacável". "Em um mundo onde tudo é regulado, em que há uma série de diretrizes para qualquer coisa, construir uma figura como essa é muito difícil — mas muito proveitosa, se a pessoa tiver êxito", explicou ele, citando o período em que Trump protagonizou o programa The Apprentice, pelo canal NBC, nos EUA. Nele, Trump agia como um empresário bem-sucedido que avaliava — e demitia — potenciais funcionários de suas empresas. O reality show ficou no ar por dez temporadas.
Não é só isso: na leitura do diretor da Arko Advice, se no primeiro mandato (2016 - 2020), Trump não imaginava que seria eleito e, assim, precisou montar uma equipe às pressas quando chegou à Casa Branca — "não à toa muita gente foi demitida tempos depois e morreu politicamente" —, dessa vez ele chamou apenas nomes assertivos e ligados à sua agenda. É também nesse sentido que o presidente acabou encapsulado em um cenário acrítico.
O papel da China – e o lugar do Brasil
Thiago de Aragão também observa como, no cenário atual marcado por táticas conflitivas dos EUA com alguns países, a China ganha uma série de espaços no contexto global. Um deles é o fato de muitos parceiros comerciais tradicionais dos norte-americanos, como o México, por exemplo, se realinharem em direção ao mercado chinês. O Brasil também está nessa lista.
O economista Antônio Lanzana, que preside o CSESP, também notou esse movimento. "Os EUA serão vistos com certa desconfiança por alguns países, e não vai demorar para alguns parceiros começarem a buscar outras alternativas", afirmou.
Mas, para Aragão, haverá um realinhamento também no soft power — uma das marcas do sucesso norte—americano no mundo. "Isso sempre foi uma vantagem muito grande para os Estados Unidos. Todo mundo quer ir para a Disney, quer mandar os filhos para estudar em universidades norte-americanas, quer ir para a Califórnia, e é claro que isso não acontecerá com a China", disse. "Mas os chineses não buscam esse soft power. O que existe agora é uma abertura para o país desenvolver seu foco central, vinculado à tecnologia, como os smartphones, por exemplo", completou.
Nesse sentido, o Brasil precisa ficar em alerta, já que corre o risco de aproximar com mais intensidade da China. "O caminho é sempre o da diversificação de parceiros, não da dependência. No caso dos EUA e da China, é preciso ser neutro, mas saber aproveitar as oportunidades", observou Aragão. "O Brasil é um país mercantil, isso é, que precisa exportar. Se somos isso, então nos compete mediar coisas que não nos compete, como as guerras [Ucrânia e Rússia e Israel e Hamas]. Somos um vendedor. Precisamos estar bem com todos os compradores", completou.
Em uma leitura focada no cenário interno, Lanzana lembrou ainda que, em um momento como esse, é fundamental que a situação fiscal esteja controlada — o que, nesse momento, não está. "A política fiscal precisa ser conduzida com extremo cuidado, porque em períodos de incertezas e inseguranças, ela ganha um peso muito grande", finalizou o presidente do conselho.