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Negócios

Brasil deve manter neutralidade para ser relevante no cenário global

Segundo especialistas, isenção diante das tensões entre Estados Unidos e China e acordos comerciais sem viés ideológico são essenciais para recuperar protagonismo internacional

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Brasil deve manter neutralidade para ser relevante no cenário global
Segunda edição do Café Sem Filtro debateu o papel do Brasil na política externa. (Arte: Tutu)

Nos últimos meses, a tentativa de recolocar o Brasil como um protagonista global e importante parceiro comercial dá a tônica da diplomacia nacional. Contudo, ainda que a retomada da participação brasileira nos principais fóruns mundiais tenha trazido prestígio ao País, a crescente disputa entre Estados Unidos e China, em meio à guerra da Rússia com a Ucrânia, desafia o Itamaraty a costurar novos acordos comerciais para o País — sem deixar o viés ideológico conduzir as negociações.

Os rumos da política internacional do Brasil foram debatidos na segunda edição do Café Sem Filtro, evento online realizado na última segunda-feira (7), pela Federação do Comércio, Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), por meio do Conselho de Economia Empresarial e Política e o Conselho de Relações Internacionais.

Diferentemente dos últimos 30 anos, quando a China — principal parceiro comercial nacional — atravessava um próspero bônus demográfico que propiciava uma volumosa oferta de mão de obra e refletia em uma produtividade industrial quase imbatível, hoje, o país asiático busca diversificar a economia, investindo no aumento da renda e do consumo local para manter um crescimento sólido do seu Produto Interno Bruto (PIB).

Essa mudança representa uma janela de oportunidades ao Brasil, principalmente no Agronegócio, segundo Roberto Dumas, professor convidado na China Europe International Business School (CEIBS) e na Universidade de Fudan, em Xangai. “O Brasil é a porta de entrada na América do Sul para a China e conta com um agronegócio bem desenvolvido para atender à alta demanda chinesa”, opinou Dumas.

Neutralidade real 

O desafio, porém, é manter a isenção frente a Estados Unidos e China. “Estamos diante do nosso maior parceiro comercial de commodities e bens primários, a China, e do maior mercado consumidor de produtos industrializados e de valores agregados, os Estados Unidos”, destacou Rubens Medrano, vice-presidente da FecomercioSP e presidente do Conselho de Relações Internacionais da Federação.

Quanto ao ambiente doméstico norte-americano, Otaviano Canuto, membro sênior do Policy Center for the New South e ex-diretor-executivo do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI), acredita que o sentimento antiglobalização, que teve ascensão com Donald Trump, vai permanecer, assim como a visão “ou estão conosco ou estão contra nós”. Ainda assim, Canuto apontou que o Brasil pode crescer no cenário global sem contrapor nenhum dos lados. “Mesmo que os norte-americanos tenham o interesse em manter certa influência sobre as ações brasileiras com o soft power, há espaço para negociar e buscar convergências. Um dos pontos fundamentais é não tomar partido dessa guerra por procuração entre Ucrânia e Rússia”, afirmou.

A isenção brasileira diante do cenário polarizado depende, segundo Dumas, de uma postura sem espaço para convicções ideológicas, como o governo parece adotar com os recentes debates acerca dos acordos entre Mercosul e União Europeia e na composição do Brics. “Existem divergências locais com a China, como o entendimento do Paraguai sobre a independência de Hong Kong, mas o Brasil também demonstra preferências ideológicas que dificultam acordos globais. Quanto mais o País apoia a entrada de Irã, Arábia Saudita e Venezuela no Brics, mais toma partido contra os Estados Unidos. O País só vai ocupar o protagonismo que espera quando adotar uma neutralidade real, sem ser pró-China ou anti-Estados Unidos”, ponderou.

Visão equilibrada externa

Na visão de Dumas, apesar do cenário complexo, o Brasil desponta como favorito a alocar recursos internacionais em razão da falta de oportunidades no cenário externo, dada a crise inflacionária que atinge Argentina e Turquia e a guerra entre Rússia e Ucrânia, por exemplo. “Do lado conjuntural, existem dois Brasis: o absoluto e o relativo. Nos Estados Unidos, os investidores veem o relativo. O investidor olha o resto do mundo — como Ucrânia, Argentina, Turquia e Belarus — e vê que há poucas opções com potencial de crescimento, como Índia, México ou Brasil”, afirmou. De acordo com Dumas, a crise sanitária pela qual a China passou em 2018, conhecida como peste suína, que devastou a produção de porcos no país, abriu mais uma janela de oportunidade ao agronegócio brasileiro por lá.

Brics e moeda única

A possibilidade de ampliação do Brics — grupo que engloba Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — pode fazer o País perder a distância estratégica que mantém das potências globais, de acordo com Dumas. “A grande funcionalidade do Brics foi a articulação. O grupo nunca teve uma ambição para além de relações comerciais. Você tem China e Índia, que não são aliados, por exemplo. Mas agora é uma aliança anti-Estados Unidos? É isso que parece. Do ponto de vista chinês, é claro que interessa, dado a rivalidade. Para que servirá isso? Não há nada claro”, afirmou Canuto.

Um outro capítulo controverso na busca por esse equilíbrio ideológico brasileiro foi a sugestão dada pelo presidente Lula, durante reunião do G7, em maio, quando indicou a adoção de uma moeda comercial única entre os países do Brics para desbancar o dólar. Segundo Canuto, essa ideia partiu da China a fim de movimentar o mercado, mas não há a possibilidade de substituição da moeda norte-americana. “A moeda única não tem potencial para substituir o dólar. Pode ser usada pela China para realizar negócios pontuais em um período polarizado, mas, depois, perderá o sentido”, destacou.

Baixa abertura

Durante o evento, Antonio Lanzana e Paulo Delgado, copresidentes do Conselho de Economica Empresarial e Política da FecomercioSP, chamaram a atenção para a necessária abertura comercial brasileira — que, atualmente, se limita ao Agronegócio. “Se olharmos os últimos 30 anos, perceberemos que o nosso ganho de produtividade foi muito baixo. No período, o crescimento médio foi de 0,4% ao ano, enquanto que os desenvolvidos cresceram 1,4%, ao passo que a expansão dos países de renda média foi de 3,8% ao ano”, disse. “Se acompanharmos os números dos últimos 30 anos da economia nacional, fica nítido que o nível da abertura comercial do Agronegócio reflete um desenvolvimento de mais de 300%. Já as áreas da Indústria e do Comércio, nas quais há enormes dificuldades para o mercado internacional, registraram queda de 20% no mesmo período”, apontou Lanzana.

Para Delgado, o sucesso internacional do Brasil dependerá da sua capacidade de se mostrar confiável e estável. “A postura atual do governo é muito confusa e nos deixa diversas questões no ar. O Brasil inspira essa confiança e esse prestígio internacional para ocupar essa posição [de relevância global]? Talvez seja mais interessante o País se manter neutro e fiel aos próprios interesses comerciais, independentemente da cor ou da ideologia do parceiro”, concluiu.

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