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Legislação

FecomercioSP e entidades tributárias repudiam voto de qualidade e aumento de alçada para acesso ao Carf

Manifesto assinado pelas instituições destaca ainda que as alterações deveriam ser debatidas no Congresso Nacional e não aplicadas de imediato via Medida Provisória

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FecomercioSP e entidades tributárias repudiam voto de qualidade e aumento de alçada para acesso ao Carf
A partir da esquerda: Eduardo Salusse, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia; Halley Henares, presidente da Associação Brasileira de Assuntos Tributários; Ives Gandra Martins, presidente do Conselho Superior de Direito da FecomercioSP; Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do Conselho de Assuntos Tributários da FecomercioSP; Alexandre Evaristo Pinto, conselheiro do Carf; Carlos Henrique de Oliveira, ex-presidente do Carf. Foto: Edilson Dias

Por Filipe Lopes

A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), por meio dos Conselhos Superior de Direito e de Assuntos Tributários, juntamente com a Associação Brasileira de Assuntos Tributários (Abat) e o Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), lançaram, na última quarta-feira (19), na sede da Federação, manifesto em prol da efetiva segurança jurídica dos contribuintes, indicando a revogação do “voto de qualidade” e a redução do valor de alçada proposto para acesso ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).

A preocupação das entidades é direcionada às mudanças promovidas pela Medida Provisória 1.160/2023, que alterou o critério de desempate nos julgamentos realizados no âmbito do Carf e elevou a alçada de 60 salários mínimos para 1.000 salários mínimos (R$ 1,3 milhões) para acesso ao órgão.

Na prática, isso significa que, em caso de empate no julgamento de processo administrativo de determinação e exigência de crédito tributário, o desempate será resolvido favoravelmente ao Fisco. A medida contraria o artigo 112 do Código Tributário Nacional (CTN), pelo qual, em caso de dúvida, a interpretação da norma deve ser dada de maneira favorável ao contribuinte.

De acordo com Ives Gandra Martins, presidente do Conselhos Superior de Direito, realizar tais alterações sem envolver o Poder Legislativo fere o CTN. “Qualquer alteração desta forma de interpretar e julgar só poderia ser veiculada por Lei Complementar, não sendo Medida Provisória o instrumento legislativo hábil para tanto. Isso denota manifesta ilegalidade por ferir a interpretação sobre o direito tributário”, ponderou.

Histórico do Carf

Entre 2017 a 2020, o órgão decidiu mais de 90% dos processos julgados por unanimidade ou maioria de votos, segundo dados divulgados pelo Núcleo de Tributação do Insper. Para Alexandre Evaristo Pinto, conselheiro da 1ª Turma da Câmara Superior do Carf, “a justificativa do Poder Executivo para retomar o voto de qualidade, sob o argumento de que a proclamação do resultado favorável ao contribuinte no caso de empate de votos provocou a reversão do entendimento do tribunal em grandes temas tributários, não procede”.

As alterações no Carf podem resultar, segundo Pinto, no aumento da morosidade do processo administrativo federal e coloca em xeque a relevância da composição paritária do órgão.

De acordo com Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do Conselho de Assuntos Tributários da FecomercioSP, os dados sobre o funcionamento do Carf são fundamentais para a sociedade debater o tema baseada em fatos. “Fica claro que a retomada do voto de qualidade no Carf aumentará o número de demandas judiciais, exatamente em sentido oposto ao que se pretende impedir com o Processo Administrativo Fiscal (PAF). A função do órgão paritário não é arrecadatória, mas ter o controle da legalidade do ato administrativo fiscal”, afirmou.

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A preocupação das entidades é direcionada às mudanças promovidas pela MP que alterou o critério de desempate nos julgamentos. Foto: Edilson Dias

Papel do órgão

Quase centenário, o órgão de julgamento na esfera federal – criado em 1924 – é um importante instrumento de soluções de conflitos de forma antecedente ao judiciário, com o viés de dar respostas técnicas aos litígios tributários.

Para Carlos Henrique de Oliveira, ex-presidente do Carf, as mudanças impostas pela MP 1.160 contrariam o DNA do órgão, em representar a sociedade e retornar a ela segurança jurídica, além de decisões imparciais. “Meu trabalho à frente do Carf sempre buscou construir pontes, porque o papel do órgão é dar segurança jurídica ao contribuinte. Não acho que uma imposição legislativa seja a melhor solução. Não haverá pacificação desta maneira e os litígios vão ser levados adiante, pois decisão que o contribuinte não entende e concorda, não cumpre”, afirmou.

O presidente da Associação dos Conselheiros Representantes dos Contribuintes no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Aconcarf), Wesley Rocha, concorda com o entendimento de Oliveira e lamenta a nova postura adotada pelo órgão. “Hoje o Carf não faz justiça fiscal, deixamos a justiça para outras esferas judiciais”, apontou.

Próximos passos

Diante deste cenário, a FecomercioSP, a Abat e o MDA buscam apoio de outras entidades da sociedade civil e de parlamentares para rejeitar a Medida Provisória 1.160, com o objetivo de revogar o voto de qualidade a favor do Fisco, para que em caso de empate, o julgamento resolva-se em prol dos contribuintes, e o restabelecimento do valor de alçada em 60 salários mínimos para acesso ao Carf.

“Nos últimos dois anos, o Congresso rejeitou todas as manifestações para o retorno do voto de qualidade, demonstrando a vontade da sociedade de manter o Carf como entidade imparcial. Mas o governo federal resolveu passar por cima disso, por meio de MP”, afirmou Eduardo Salusse, presidente do MDA.

Já o presidente da Abat, Halley Henares, projeta um “aumento na litigiosidade no País, contribuindo para a elevação ainda maior do contencioso tributário nacional”. Hoje o contencioso tributário brasileiro é de R$ 5,44 trilhões, cerca de 75% do Produto Interno Bruto (PIB) – de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e publicada pelo Instituto Insper, em 2022, e a previsão é que o cenário piore, caso seja mantido o voto de qualidade nos termos vigentes e apresentados pela MP.

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